"Soldado da Saúde" - Moro
Há neste momento 3317 profissionais
de saúde infectados e os enfermeiros são os mais afectados, ou seja,
1088. São os mais infectados e os mais afectados em termos
salariais, como agora e mais uma vez ficou demonstrado: vários
enfermeiros, entre os quais um casal a trabalhar no CHUC, viram o
vencimento deste mês cortado a 100%, receberam somente as horas
suplementares efectuadas há alguns meses, ou fortemente cortado, por terem ficado doentes
pela Covid-19. As queixas que chegaram à Ordem dos Enfermeiros são
mais que muitas, provenientes principalmente do
Centro Hospitalar Universitário de Coimbra (está sempre na linha da frente!), do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, do Hospital
de Bragança e do Centro Hospitalar Universitário do Porto.
Como bem refere a Ordem dos
Enfermeiros, os enfermeiros não pagam as despesas pessoais ou
familiares com “palmas”, precisam de dinheiro para viver. Ficar
sem o vencimento ou vê-lo fortemente cortado é terrível, e ainda
por cima um vencimento já de si minguado graças à actual carreira
que nada beneficiou a classe em termos remuneratórios, nem de
actualização e progressão; uma carreira que de “nova” só tem
o nome, uma carreira para a estagnação, cortando qualquer perspectiva de futuro.
E se o futuro é a negação, o
presente já se mostra bem negro, com os enfermeiros em contrato
individual de trabalho (CIT), à semelhança dos outros trabalhadores
da Saúde em mesma situação, a serem prejudicados pelo simples
facto de não estarem em contrato de trabalho em funções públicas
(CTFP), recebem cerca de menos 20%, com horário de 35 horas, e
quando estão doentes recebem 70% e pagos pela Segurança Social: na
enfermagem há profissionais de primeira, apesar de fraca, e de
segunda. No caso e ao que parece, aquelas instituições ainda não
tinham enviado os certificados de incapacidade temporária para o
trabalho para a Segurança Social. Por aqui se avalia o desprezo com
que as administrações, constituídas na sua maioria por comissários
políticos do PS, tratam os trabalhadores.
A situação dos trabalhadores do
Estado com CIT é de dupla exploração: no cômputo, ganham menos,
possuem menos regalias, por exemplo, os enfermeiros que trabalham em
serviços de psiquiatria ou de oncologia não beneficiam de mais 5
dias de férias por ano nem a redução de uma hora de trabalho
semanal por cada três anos de serviços, como acontece com os
colegas em CFTP. E, mais grave ainda, estão fora da carreira e sem
verem os anos de serviço a contar para a progressão. Perante tão
dramática situação, os sindicatos, com especial destaque para o
SEP, que ainda anda com o governo do PS ao colo, nada ou pouco têm
feito na prática, para além de pedinchar reuniões com a ministra,
agora tão atarefada a dizer mentiras em doses diárias
televisivas.
Como também refere a OE (embora possua alguma quota-parte de responsabilidade na situação
criada pela actual carreira, porque foi feita à medida dos seus
interesses e de acordo com os gostos dos chefes, a única categoria
beneficiada, e agora pomposamente denominados “gestores”, alguns
deles mal sabem redigir um texto em português inteligível), fácil
se torna ao Governo assegurar estes vencimentos a 100%, pelo baixo
significado em termos financeiros e, dizemos nós, seria uma prova,
embora insignificante, de reconhecimento do esforço acrescido
despendido pelos enfermeiros que estiveram, e ainda estão, na
primeira linha de combate.
Não é despiciendo lembrar que,
segundo o último inquérito realizado pela Escola Nacional de Saúde
Pública na Universidade Nova, “Saúde Ocupacional do Barómetro
Covid-19”, 72% dos profissionais de Saúde dizem estar cansados, em
níveis médios e altos de exaustão (Burnout), representando um
aumento de 10% em relação à semana anterior; e desses, 58%
aproximam-se de “uma situação de esgotamento” e 42% referem
também que dormem menos de seis horas. Ora, nem será preciso dizer,
como aponta o coordenador do estudo, que “não é possível um bom
combate à Covid-19 sem bons, saudáveis e seguros combatentes”. E,
acrescentamos nós, sem um correspondente digno vencimento, pago a
tempo e a horas.
Ah!, a administração do CHUC, que
sempre se pautou por pagar mal e porcamente aos enfermeiros, com
dívida crónica de milhares de horas, que têm sido pagas a conta
gotas (por imposição dos próprios enfermeiros e não por obra dos
sindicatos) e nem sempre como trabalho suplementar/extraordinário,
usando por vezes um critério dúplice, afirmou, e depois de ser
questionada pela Ordem, que “procederá ao devido acerto das verbas
em causa durante a próxima semana”. A ver vamos, como diz o cego.
Esta administração costuma mentir
com todos os dentes, quando fala, porque muitas das vezes ou cala-se
e faz de conta que nada é com ela ou faz “desaparecer” os
requerimentos de algum funcionário a solicitar acerto de contas. E
uma das mentiras mais recentes, fazendo coro com a ministra, é a de
que são feitos testes de despiste a todos os funcionários que tiveram contacto directo com doentes de Covid-19, o que é uma rematada mentira; assim
como afirmar que não há falta de material de protecção (EPI) e
outro. E já agora também gostaríamos de saber o que é feito de
donativos, nomeadamente alimentos e bebidas, que são entregues por
particulares para os profissionais que estão na primeira linha da
frente? A pergunta também é dirigida a alguns enfermeiros
“gestores”.
A propósito, o Sindicato dos
Enfermeiros - SE (o SEP mantém-se calado, tal como a
administração do CHUC, parece haver alguma afinidade entre ambos) irá entregar
uma reclamação contra o Estado português à Organização
Internacional do Trabalho (OIT) “por violação de normas
relativamente à actuação na pandemia causada pela Covid-19”.
Concretamente, “estão
em causa horários de trabalho (incumprimento da legislação
específica da Carreira Especial de Enfermagem e dos IRCT -
Instrumentos de Regulamentação Colectiva de Trabalho), o não
pagamento de trabalho suplementar (após as 35 horas semanais) e o
não pagamento do Regime de Prevenção e disponibilidade permanente
previstos na legislação”.
Em
vez de palmas e de mentiras, os enfermeiros, e todos os profissionais
de saúde, precisam é que o Governo do senhor Costa lhes pague o que
lhes é devido e reconheça na prática o seu extraordinário
trabalho, e não continue a destruir o SNS (se não fosse o serviço
público de saúde teria havido uma catástrofe) como pretende com o
regresso das malfadadas Parcerias Público Privadas.
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