O novo/velho ministro da saúde, Manuel Pizarro
(médico para que se conste), tomou posse do cargo corroborando o que toda a gente
sabe de há muito, são precisos mais meios e os que existente devem ser melhor
geridos. É a verdade de La Palice que pouco ou nada diz sobre a política que
irá ser seguida no sector da Saúde em Portugal.
Mas, passado pouco mais de quinze dias, o
ministro já levanta um pouco o véu das suas verdadeira e reais intenções ao
acusar os farmacêuticos do SNS, em greve, de “adiarem tratamentos oncológicos”;
coisa que logo o sindicato negou. A postura em relação aos enfermeiros não está
a ser muito diferente pela razão de não atender às propostas das suas
organizações sindicais de valorização da carreira e da promoção justa e igual
para todos os profissionais, independentemente de serem ou não especialistas ou
de estarem em CIT ou CTFP.
Não será difícil adivinhar como vai ser esta
valorização, nomeadamente no que concerne aos valores remuneratórios, na medida
em que o aumento dos 2% estará longe de constituir um atractivo para a
contratação de novos profissionais e, pelo contrário, fará com que os técnicos
mais qualificados continuem a fugir para o sector privado, onde, na maior parte
das vezes, vão trabalhar como trabalhadores em nome individual, mas com maiores
proveitos. A Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares já tinha
confirmado, depois de analisar o Orçamento de Estado para 2023, que esta não
será a melhor forma de reter os profissionais no SNS.
Os factos e algumas declarações do ministro
revelam os reais objectivos da política deste governo para a Saúde: a
continuação do mesmo; isto é, manter a senda de degradação do sector público da
Saúde para claro benefício dos empresários da saúde/doença, que ainda não
contestaram a figura do ministro porque sabem que é um dos seus. Não será por
acaso que há em Portugal uma forte inclinação para nomear como ministro de uma
das mais sensíveis, se não a mais sensível, áreas de serviços prestados pelo Estado.
Pizarro parece estar disposto a querer
satisfazer todos os lóbis que enxameiam e parasitam o SNS, desde os grandes grupos
de exploração de unidades de saúde até aos laboratórios farmacêuticos. Não teve
a mínima hesitação em afastar a “existência de preconceito” em relação aos
setores privado e social, sublinhando que a prioridade é a prestação no serviço
público sempre que se revele vantajoso (para os privados, evidentemente), porque
haverá “complementaridade nos serviços”, que previamente foram degradados, como
está a acontecer com as maternidades. O governo destrói e os privados avançam
para ocupar o espaço vazio. E as PPP para a construção e gestão de novos
hospitais, como de outras infra-estruturas, serão para avançar.
Não foi novidade o facto de a Comissão de
Acompanhamento tenha proposto o encerramento de quatro urgências de obstetrícia
e ginecologia nas regiões de Lisboa e do Centro, concretamente os serviços de urgências
nos hospitais de Vila Franca de Xira, Barreiro, Covilhã e Castelo Branco,
locais onde já existem serviços privados; o que provocou imediata revolta por
parte de autarcas e de grande parte da população.
Perante a decisão/aconselhamento, feito por
gente que tem interesses no negócio, o ministro correu logo a dizer que "nenhum
serviço de obstetrícia e bloco de partos fecha este ano". Não será este
ano, será no dia 1 de Janeiro de 2023, ou seja, no dia seguinte. O negócio já
foi destacado como fortemente rentável no âmbito do turismo dos nascimentos. Também
não será fortuito o caso de Portugal ser o país onde se fazem mais partos por
cesariana, e com especial evidência nas clínicas privadas, para assim melhor
facturarem – o Estado vai pagando.
Ainda há pouco o ministro reconheceu a necessidade
de se rever o preço dos medicamentos, explicando a subida, que não ficará pelo aumento
da inflação, pelos custos de produção. Já possuímos medicamentos caros que
impedem que muitos cidadãos com menores posses financeiras, por exemplo, os
idosos, grandes consumidores de medicamentos e de cuidados de saúde, tenham
pleno acesso a um bem essencial. Daqui para frente iremos assistir ao
agravamento da saúde de quem já tem pouca e a uma descida brusca da qualidade e
da esperança de vida da população portuguesa.
O ministro, e o Governo em que participa, diz
estar preocupado com a saúde dos cidadãos quando ataca os farmacêuticos em
greve, mas nada diz quanto à responsabilidade de muitos diagnósticos não terem
sido feitos a tempo, devido ao lockout do SNS a pretexto do tratamento dos
casos de covid-19. A culpa é sempre atirada para cima dos trabalhadores, o
patrão/estado tem sempre razão, mesmo quando desbarata os dinheiros públicos em
contratações por ajuste directo pela aquisição de bens por intermédio de
empresas pertencentes a amigos e compadres, em vez de as fazer a directamente
com os fabricantes. O negócio das luvas de nitrilo com uma empresa de reparação
de automóveis, a Escape Fort-Ldª, no valor de mais 1,5 milhões de euros ficará
para a história dos desmandos do governo PS – uma estranha maneira de bem gerir
os dinheiros de todos nós.
O “compromisso ético” de que fala o ministro
quando ataca os farmacêuticos fica bem retratado com a negociata atrás referida.
Mas outras já foram denunciadas, também pela publicação online “PaginaUm”, como
seja a compra de vacinas no montante de mais de 500 milhões de euros, 33
milhões de doses, sem ainda ter tornado públicos todos os contratos feitos com
as farmacêuticas. Apenas quatro, dois com a Pfizer e outros dois com a Moderna,
se encontram no Portal Base.
A campanha para a continuação da vacinação,
quer dizer para o escoamento das vacinas que não foram administradas, parece
ter falhado, as pessoas já não vão na conversa das hipotéticas vantagens da
vacinação. Há pouco menos de meia dúzia de dias só se encontravam vacinadas cerca
de 35% das pessoas elegíveis contra a covid-19 e 44% contra a gripe. A desconfiança
aumentou porque o governo e o seu instrumento DGS têm-se recusado a publicar
todos os dados sobre as reacções adversas das vacinas, do número exacto de
óbitos, concretamente nos lares de idosos, cuja maioria ainda se encontra na ilegalidade,
o que bem demonstra a preocupação que o governo nutre pela nossa população mais
idosa, e das negociatas em geral relacionadas com a covid-19.
O futuro do SNS está coberto por forte nebulosidade
se não nuvens negras, e sem profissionais motivados, bem recompensados em
termos financeiros e de formação, não haverá SNS de qualidade e nem SNS de
todo. Há responsáveis pelo descalabro e os nomes já aqui foram mencionados e
por mais do que uma vez, no entanto, pizzarro*, parecendo cabeça de tartaruga, ficará
na história pelas piores razões.
*Em castelhano pizarra significa “quadro preto” ou “ardósia”.