sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Carta de um delegado sindical à direcção do SITAVA a denunciar a traição


Uma carta exemplar de um trabalhador, Carlos Costa, delegado sindical do SITAVA (CGTP/Inter), que interpela com grande veemência os traidores acolitados na direcção deste sindicato, que com o acordo de traição feito nas costas da maioria dos trabalhadores do SPDH (Groundforce), deitaram por terra os pergaminhos de história de luta deste sindicato – lembrando um pouco atitude semelhante perpetrada pela direcção do SEP. Ao mesmo tempo indica caminhos de luta para se impor a destituição desta direcção de traição. A Luta é dura, mas os trabalhadores não vergarão!

«Aos dirigentes sindicais do SITAVA:

É com enorme tristeza que vos vejo dirigir o SITAVA, um sindicato com história combativa, com tal ligeireza e subserviência. Exige-se coragem política, principalmente numa altura como a que atravessamos de descarado ataque ao direito ao pão. Abandonaram a luta? Resumem-se agora à concertação social?? O que vejo é uma enorme desconcertação sindical!!!

Já havia mostrado a minha preocupação com a vossa postura. Confirmo agora, após receber vossa comunicação sobre “resumo do acordo de princípio com a TAP e SPDH” que navegam atrelados à vontade do STHA!!! Fazer copia do email do STHA e encaminhar para os vossos associados é o cúmulo. “Qualquer esclarecimento adicional, por favor contacte o STHA.” É mesmo isso que querem?

A larga maioria dos delegados sindicais está do lado dos trabalhadores, na luta contra a privatização e exploração, na defesa da empresa pública e independente da TAP, portanto do Estado, logo assim cumprindo as directivas europeias para obtenção da licença de handling.

A tentativa de coacção dos dirigentes sobre os delegados, ameaçando com a destituição, não me assusta. No SITAVA os delegados sindicais são independentes e eleitos pelos associados devendo levar e fazer valer a voz destes junto da direcção. É o que pretendo continuar a fazer. Continuo ao lado dos que foram expulsos injustamente de outros sindicatos por desempenharem honestamente a sua função e cidadania. (o SINTAC expulsou o delegado que foi à sede do SITAVA com outros colegas pedir esclarecimentos.)

A falta de transparência e democracia demonstrada tem sido gritante. Recusaram a vontade inequívoca dos trabalhadores de reunir em plenário geral antes de qualquer negociação e vêm agora pedir aos associados para legitimarem o vosso acordo traidor. Feito em moldes no mínimo suspeitos levando as reuniões para hotéis afastados dos locais de trabalho, sem estacionamento e numa altura em que muitos estão de férias e usando o voto secreto. Chamo a isto manipulação!!!

Sei que não é ingenuidade, embora queiram fazer parecer, dizerem que acreditam que administração vai reduzir em 90% o trabalho temporário para contratar directamente. Vocês sabem, pelo menos desde 11 de Novembro, altura em que levei essa questão junto dos dirigentes Simão e Meireles à sala do H4, que a administração da SPDH abriu 3 concursos públicos que visam exteriorizar e precarizar a força de trabalho adjudicando a empresas prestadoras de serviços o trabalho que nos pertence, cedendo ainda a essas empresas o nosso equipamento de terra por contrato de comodato (empréstimo)!!

Perder o que foi conquistado com sacrifício de muitos só à força, nunca negociado!! Como tal e em relação à meia dúzia de clausulas que anunciam abdicar (das 35 que querem deixar cair) digo claramente NÃO!

Escravizar os trabalhadores obrigando-os a permanecer 11h30m no trabalho (10h de trabalho + 30m pequeno-almoço + 1h almoço) durante 3+3 meses no verão IATA para fazerem part-time 5 ou 6 horas sem refeição o resto do ano e ainda aumentar os dias de trabalho para turnos de 5 dias (4,98 para ser mais preciso) é uma completa desregulação social inaceitável. (o acordo dá para fazer horários destes!)

É igualmente inaceitável prejudicar os novos contratados, já por si mais desfavorecidos com escalões miseráveis e fazer disso uma bandeira à “criação de emprego no País ”-parecem os governos fascistas a falar!!!

Por último quero apelar aos demais delegados sindicais que não baixem os braços e não se demitam dos seus lugares. Pelo contrário sugiro que nos unamos para convocar Assembleia Geral Extraordinária (conforme estatutos) onde o ponto de ordem principal seja a destituição desta direcção.

Só com a luta manteremos o direito ao pão.

O delegado sindical, Carlos Manuel Costa 27225/2
Associado 8156

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

SAÚDE, S. A.


Melhor negócio que a saúde só mesmo a indústria de armamento!" Estas são palavras claras proferidas em 2008 por alguém com responsabilidades de chefia da área negocial de saúde de um grupo económico privado. Há muito que quem assim pensa a saúde tomou conta dos destinos desta área da nossa vida colectiva. E, passo a passo, foi esvaziando o serviço público e criando condições para o florescimento do negócio privado. Como em tantos outros sectores - no ensino, na cultura, na segurança social - a tomada do Estado pelos liberais serve sobretudo para, a partir dele, criar um mercado e (des)regulá-lo a contento. O anúncio, no início desta semana, do agravamento drástico do valor das taxas moderadoras pelo Governo segue esse rumo. A estratégia é clara: encurtando o mais que pode a diferença entre pagamentos de saúde pelas famílias no sector público e no sector privado, o Governo fomenta a transferência de utentes do Serviço Nacional de Saúde para a medicina privada. Esse é o seu desígnio. Definitivamente, a única coisa que as taxas moderadoras querem passar a moderar é a reserva de muitas pessoas a engrossarem as fileiras dos consumidores de serviços privados de saúde.

O Governo sabe, e não o disfarça, que a forma mais eficiente de, no curto prazo, reduzir despesa pública de saúde é ter menos doentes em tratamento. A canção de embalar dos "ganhos de gestão" chegou portanto ao fim. É de cortes no tratamento que se trata - não há outra interpretação possível para esta decisão do Governo de, no momento mais duro do aperto dos orçamentos familiares de quem ganha já tão pouco, aumentar brutalmente a co-responsabilização das famílias pelo pagamento da saúde. Menos doentes no SNS e mais clientes dos seguros de saúde privados - eis o que hoje anima a política governamental de saúde.

E a procissão ainda vai no adro. No seu afã de ir sempre mais além do que o programa da troika impõe, Passos Coelho veio, lesto, avisar que se está ainda "muito longe de esgotar o plafond de crescimento das taxas moderadoras". Para bom entendedor... Aliás, o novo quadro legal aprovado pelo Governo mantém, a este respeito, um truque extraordinário: as taxas moderadoras não poderão exceder um terço dos valores da tabela de preços do SNS, mas quem fixa essa tabela é o mesmo Governo. Por outras palavras: o plafond de crescimento das taxas moderadoras nunca estará esgotado, basta que o Governo actualize a tabela de preços do SNS em conformidade. Sabemos bem o que isto significa. Preparemo-nos para muito más notícias: hoje, o Governo sobe as taxas moderadoras, amanhã porá os doentes a pagar os cuidados de saúde que recebem no SNS.

Os liberais disfarçados de tecnocratas alegam, como sempre, que não há alternativa. Desta vez porque, dizem, os custos da saúde aumentaram exponencialmente. É certo. E os submarinos, desceram porventura de preço? E os juros das parcerias público-privado, terão parado de crescer? E o financiamento do buraco do BPN, encolheu? Ou, pelo contrário, em todos estes e outros rombos ao erário público, o respectivo "plafond de crescimento" parece ilimitado? A questão verdadeira não é, pois, a de um crescimento singular da despesa em saúde. Não, a questão é de opção política. Quisera o Governo impor aos operadores privados o mesmo corte de 15% que impôs aos hospitais públicos e pouparia 150 milhões de euros anuais. Quisera o Governo impor às parcerias público-privado na saúde essa mesma redução de financiamento de 15% e aforraria 45 milhões de euros. Quisera, enfim, o Governo aumentar para 50% a quota de mercado dos genéricos e pouparia 200 milhões de euros por ano.

Na saúde é a democracia que se joga. Ou prevalecem os direitos ou floresce o negócio. Não há terceira via.

Original em http://www.dn.pt/inicio/opiniao/interior.aspx?content_id=2188638&seccao=Jos%E9 Manuel Pureza&tag=Opini%E3o - Em Foco

domingo, 11 de dezembro de 2011

Muda o partido no governo, substituem-se os boys na administração pública (SNS).


A história repete-se: em algumas das mais recentes nomeações para conselhos de administração de centros hospitalares voltou a acontecer a tradicional dança de cadeiras, apesar das recomendações da troika. Saíram os ditos “gestores” do PS, entraram gestores com ligações ao PSD e ao CDS. E, noutras nomeações ainda em preparação, fervilham as movimentações partidárias para a escolha de militantes ou simpatizantes dos partidos no poder. Tudo gente sem competência, sem conhecimentos e sem ética, valendo-lhes apenas o cartão do partido, um ou outro compadrio mais pessoal ou a máfia da maçonaria. O eterno e incontornável compadrio que ancestralmente atravessa os diversos regimes políticos que têm vigorado neste país.

«O memorando de entendimento assinado com a troika refere expressamente que os presidentes e membros das administrações hospitalares "deverão ser, por lei, pessoas de reconhecido mérito na saúde, gestão e administração hospitalar", que seria uma medida a aplicar já no quarto trimestre deste ano. A assessoria do Ministério da Saúde defende, porém, que a obrigatoriedade de concursos para novos dirigentes apenas se aplica "nos casos dos institutos públicos e das direcções-gerais", ou seja, na administração directa do Estado. E alega que os hospitais EPE (entidades públicas empresariais) "não têm o mesmo estatuto" e a escolha fica nas mãos dos accionistas, que são os ministérios da Saúde e das Finanças». – É o que se lê na imprensa e que continuamos a citar.

«Até à data, houve duas reconduções de conselhos de administração - foi o que aconteceu no Centro Hospitalar de S. João (que integra os hospitais de S. João, no Porto, e o de Valongo) e no Centro Hospitalar Leiria-Pombal. Já no Centro Hospitalar do Porto (Hospital de Santo António, Maria Pia e Maternidade Júlio Dinis), regressou à presidência da administração (onde esteve entre 2002 e 2009) Fernando Sollari Alegro (CDS), que se tinha retirado a seu pedido por motivos de saúde. Mas esta nomeação não tem sido posta em causa».

«O que já gerou controvérsia foi o regresso ao Hospital de Viseu (agora Centro Hospitalar Viseu-Tondela) de Ermida Rebelo, que é militante do PSD e tinha dirigido a unidade nos governos de Durão Barroso e Santana Lopes. Com ele foi nomeado Rui Melo, dirigente do PSD de Viseu. As escolhas foram de imediato criticadas pelo vice-presidente da bancada parlamentar do CDS, Hélder Amaral, que disse, citado pelo Diário de Notícias, não estar "disponível para pedir sacrifícios aos portugueses e depois patrocinar o amiguismo da pior espécie que julgava ser uma prática do passado"», – diga-se, de passagem uma opinião honesta!

«De igual forma a escolha de três dos cinco gestores do novo Conselho de Administração do Centro Hospitalar do Médio Tejo (Tomar, Abrantes e Torres Novas) motivou acesas críticas. Os novos gestores - Joaquim Esperancinha, António Lérias e João Lourenço - tinham dirigido o centro hospitalar durante o Governo PSD/CDS, regressando depois para uma empresa de tubos de plástico com sede no Cartaxo, de onde tinham saído. O primeiro é licenciado em Engenharia Electrotécnica, o segundo, em Organização e Gestão de Empresas, e o terceiro tem um MBA em Gestão de Empresas».

Muda o partido no governo, substituam-se os boys na administração pública. Ou utilizando uma linguagem mais vernácula, "mudam as moscas mas a merda é a mesma". Porque a política é a mesma e nem o estilo se altera. E muitos dos boys, como se pode constatar mais uma vez, é gente sem formação na área da saúde, basta-lhes o cartão do partido.

«Entretanto, para presidir à administração do Centro Hospitalar da Cova da Beira foi convidado o médico Miguel Castelo Branco (do CDS), que ocupara o cargo entre 2002 e 2006. Vem substituir João Casteleiro, do PS». Em Coimbra, depois de muita agitação e depois de se conhecerem estes nomes que replicamos da imprensa, ficou-se a conhecer os nomes de José Martins Nunes, antigo secretário de Estado da Saúde num governo PSD/Cavaco, para presidente da administração do centro hospitalar, depois de, algumas semanas antes, ter sido indicado o nome do professor universitário Fernando Guerra (PSD), e o nome de António Marques para enfermeiro director. Tudo gente de inteira confiança do governo fascista PSD/CDS e do contabilista que ocupa a pasta da Saúde: em força no desmantelamento do SNS e da entrega dos serviços (e mercado) mais rentáveis aos tubarões do privado!

PS: A partir de Janeiro, as putativas “taxas moderadoras” na saúde dobram, como a chouriça!

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

24 de Novembro – quem são os violentos?


MAIS PROVOCADORES INFILTRADOS DESMASCARADOS: “Casal” de polícias à paisana: o de casaco azul e o de casaco castanho. Estão os dois em todas as fotos (Foto retirado do blog “5 dias”)


A Plataforma 15 de Outubro, internacionalista, apartidária e pacífica, reivindicando a reposição da justiça e da verdade no que diz respeito aos eventos do dia 24 de Novembro, declara:

1. Testemunhámos e denunciamos a presença de polícia não fardada e não identificada na manifestação de 24 de Novembro em frente a São Bento. Estes elementos, entre os manifestantes, incitaram à violência com palavras e acções, ao contrário do que afirmou inequivocamente o Ministro da Administração Interna. Esta acção da polícia de um Estado de Direito e dito “democrático” configura uma ilegalidade e um crime. A acção da polícia nos piquetes de greve deste dia pautou-se igualmente pela ilegalidade e repressão, tendo-se apresentado nos locais onde se encontravam os piquetes armada com caçadeiras e metralhadoras, além de ter sido enviada polícia de intervenção para atacar e romper os piquetes.

2. Repudiamos ser, consciente e propositadamente, apelidados de “delinquentes”, “criminosos” e outros adjectivos que claramente configuram um insulto pessoal e colectivo, com o único objectivo de anular a Plataforma 15 de Outubro como sujeito político. Foi impedida a realização da Assembleia Popular prevista para as 18h00, hora em que começaram os distúrbios. Está a ser construída, consciente e propositadamente, uma narrativa de terror social que visa claramente criminalizar o movimento social e os eventos da Greve Geral e manifestação que, tendo sido um grande sucesso, é minorada pela construção de factos e eventos de “violência” por parte das estruturas de poder.

3. Manifestamo-nos contra a detenção avulsa de pessoas isoladas, outra tentativa de reforçar esta narrativa criminalizadora.

4. Somos e continuaremos a reivindicarmo-nos como uma plataforma de acção política pacífica e não aceitaremos ser, como colectivo, associados a qualquer acto de violência que cidadãos em nome individual possam cometer na demonstração da sua legítima revolta.

5. Rejeitamos a inversão total e propagandística da verdade que está em curso, procurando apelidar de violentas pessoas e movimentos que procuram defender os seus direitos e interesses de forma pacífica. A violência das medidas de austeridade é que é indesmentível e por mais cortinas de fumo que por ela sejam lançadas, está à vista de todo o povo. Acusamos o governo de violência, directa e indirecta, sobre o país.

6. Em resposta a esta campanha vergonhosa, informamos que convocaremos uma nova manifestação, a realizar no final de Janeiro.

Por tudo isto, a Plataforma 15 de Outubro exige:

 A divulgação pública das provas audiovisuais, filmes e fotografias que demonstram claramente a presença e acção provocadora de agentes da polícia não identificados e não fardados dentro da manifestação que ocorreu no dia 24 de Novembro.

 A abertura, por parte das entidades competentes, de inquéritos que visem a investigação da acção policial, nomeadamente o uso de violência sobre manifestantes isolados e a instigação à violência por parte de elementos não identificados e não fardados da polícia.

 Que os meios de comunicação social, que tão prontamente assumiram esta narrativa distorcida dos acontecimentos, dêm espaço às informações que têm vindo a público, cumprindo o seu dever de informar e repôr a verdade dos factos.

 Que sejam retiradas consequências do facto de terem sido proferidas publicamente inverdades por parte do Ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, que reforçaram uma narrativa que não corresponde comprovadamente à verdade dos factos.

 Que os detidos no dia 24 de Novembro sejam absolvidos, sendo tido em conta nos seus processos o facto de terem sido detidos de forma ilegal e abusiva através de agentes provocadores que, além do mais, incitaram delitos. Expressamos total solidariedade em relação aos companheiros e companheiras detidos nesse dia.

A criminalização da actividade política e da contestação é um sinal claro dos tempos em que vivemos, em que a Democracia é ameaçada e posta em causa justamente pelo Estado que tem como dever protegê-la. A tentativa de suprimir os acontecimentos históricos que foram a Greve Geral de dia 24 de Novembro e a expressão popular ocorrida na manifestação nesse dia serve de sinal de aviso às forças progressistas.

Não permitiremos que vingue a tentativa de fazer com que o medo sufoque a legitimidade das reivindicações populares à dignidade e aos direitos e, como tal, estaremos novamente nas ruas, no final de Janeiro.

Original em: http://www.15deoutubro.net/pagina-inicial/1-docs/610-24-de-novembro-quem-sao-os-violentos.html

domingo, 27 de novembro de 2011

O ‘Amadora-Sintra’ e o logro das PPP’s na saúde


Foi a partir dos governos de Cavaco Silva que o Estado começou a ser assaltado pelos grupos económicos, reconstituídos precisamente neste governo a partir dos restos das antigas corporações económicas do tempo do salazarismo. Não contentes com a “restituição” das antigas empresas agora revalorizadas em termos exponenciais, estes velhos/novos senhores do dinheiro colocaram ou compraram no seio da administração pública homens de mão que lhes permitiu o roubo sistemático e legal. Depois de concretizado o saque estes homens de mão passaram-se de armas e bagagens para as administrações dos grupos a quem fizeram o frete, gente proveniente de todos os partidos do arco do poder. No caso, ainda em tribunal, da burla que foi a gestão privada do Hospital Amadora-Sintra, a primeira parceria público-privada no sector da saúde, o juiz ainda hesita se deve colocar atrás das grades os 20 funcionários corruptos que, ilegalmente, enfiaram nos bolsos do grupo Mello 60 milhões de euros – que o estado, diga-se de passagem, jamais reaverá. Ou como a justiça dá aval às vigarices quando são cometidas pelos poderosos do dinheiro. E quando não se destrinça o Estado dos grupos económicos, ou vice-versa, então temos o fascismo instalado.

Retirado daqui:

“O Estado espera há oito anos fim do processo que vale 60 milhões”, título do jornal Público na edição de hoje, Domingo. O Estado Português, dócil e modelado por um sistema judicial moroso e de frequentes desconexões e ineficácias, o Estado Português, dizia, bem pode esperar sentado. A título de imagem, chame-se-lhe “O Estado Sentado” – houve aqui uma oportuna inspiração cuja origem, todavia, omito.
O processo é complexo e envolve mais de 20 quadros e altos responsáveis pela gestão do sector de saúde. Das diversas figuras envolvidas, consta Margarida Bentes. Desenvolveu trabalhos de grande mérito na área da gestão pública da saúde, assumindo particular relevância a comparticipação no estudo e concepção dos GDH’s (Grupo de Diagnósticos Homogéneos), para efeito de determinação de critérios de custeio do sistema de financiamento dos hospitais públicos.

De toda esta longa e absurda novela, de Margarida Bentes, entretanto falecida, transferiram para os herdeiros as obrigações decorrentes da chamada responsabilidade reintegratória, ou seja, o dever dos herdeiros devolverem o dinheiro ao Estado. De resto, na súmula possível de um documento jurídico complexo e confuso, o Tribunal de Contas, no número 1.9, números 7 e 8, pode destacar-se:

7 – A responsabilidade financeira reintegratória é uma responsabilidade pessoal, mas, também, patrimonial.

8 – Assim sendo, atento o que se expõe nos artigos 2068.º e 2071.º do C.C. e 69.º, n.º. 1, da LOPTC, a responsabilidade reintegratória à demandada Margarida Bentes não extingue pela morte e haveria que suspender a instância para que se procedesse à habilitação de herdeiros;

À boa maneira da intricada e embaraçosa justiça portuguesa, segundo o Público, o juiz conselheiro “Carlos Morais Antunes retoma o processo a 18 de Novembro – 2010, acrescento – e, 12 dias depois, ordena a citação dos herdeiros, que contestam a acção principal já em Janeiro de 2011. No passado dia 2 de Maio, o juiz indefere em definitivo as pretensões dos filhos de Margarida Bentes”.

O incompreensível imbróglio judicial rodopia, pois, à volta dos herdeiros de Margarida Bentes, parecendo ignorar o grupo de mais de duas dezenas de envolvidos no processo, e sobretudo certos factos de relevância jurídica e política que, a meu ver, deveriam ser nucleares do processo, como:

1. Cavaco Silva adjudicou a obra, em 1989, em regime de PPP – Parceria Público-Privada, orçamentada em 7,9 milhões de contos (cerca de 39 milhões de euros) e verificou-se uma derrapagem no custo final para 20 milhões de contos (100 milhões de euros, a valores actuais);

2. Nem o Governo da altura, nem a Inspecção da Saúde, nem o Tribunal de Contas explicaram publicamente as causas da derrapagem;

3. A exploração do hospital foi adjudicada, como se sabe, ao Grupo Mello Saúde, tendo tido como única concorrente a Cross, de José Roquette, entretanto absorvida pelo grupo vencedor;

4. Quem firmou o acordo da adjudicação foi o então Secretário de Estado da Saúde, Lopes Martins, que, uma vez libertado de funções governativas, transitou para a direcção da Mello Saúde;

5. O Ministro da Saúde de Barroso, Luís Filipe Pereira, ainda hoje quadro superior do Grupo Mello – na EFACEC, creio – converteu um crédito em dívida do Estado , com o auxílio de um chamado tribunal arbitral constituído por: Prof. Fausto Quadros, da FDL, em representação do Ministério da Saúde, Maria José de Serra Lopes pelo Grupo Mello e Calvão da Silva árbitro presidente e ex-deputado do PSD.
A história, além de complexa, é longa. Quem tenha interesse em conhecê-la na íntegra pode ler aqui – também não alinho pelo PCP, mas verdades são verdades, independentemente de quem as profere.

PPP’s na saúde, na rodovia e em outros investimentos partilhados entre público e privado são lesivos para os contribuintes. Mas, pelos vistos, nada disso incomoda o actual governo que prefere apropriar-se de dinheiros dos cidadãos e, na saúde, continuar na senda das PPP, agora ao que parece para o ‘Hospital de Todos os Santos’ em Lisboa.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Greve Geral de 24 de Novembro: O país pára e o povo sai à rua!


No passado dia 15 de Outubro, a manifestação que juntou em Lisboa milhares de pessoas apelou a uma Greve Geral. Depois da sua convocação conjunta pela CGTP e UGT, a plataforma que organizou a mobilização do dia 15 de Outubro em Lisboa anunciou o seu apoio à paralisação do próximo dia 24 de Novembro e a realização de uma manifestação nesse dia de luta. A manifestação está anunciada para as 14h30 no Marquês de Pombal, donde parte para o Rossio (para encontrar a concentração de trabalhadores organizada pela CGTP), seguindo depois para São Bento. Esperamos e trabalhamos para que esta seja uma grande manifestação, num grande dia de paralisação dos trabalhadores. Apelamos, portanto, nesta convocatória aberta, à participação de todos os movimentos e de todas as pessoas: mais e menos precários, com e sem emprego, já reformados ou ainda estudantes - todas as vítimas do regime da austeridade são importantes nesta jornada.

QUE TRABALHADORES DO ESTADO CAMINHEM AO LADO DOS TRABALHADORES DO SECTOR PRIVADO!
QUE A GREVE NO SECTOR DA SAÚDE SEJA A 100%!

«A ‘Plataforma 15 de Outubro’ marcou nova manifestação para o próximo dia 24 de Novembro, coincidente com o dia da Greve Geral Nacional. A concentração para a manifestação far-se-á às 14h30, no Marquês de Pombal e percorrerá a Avenida da Liberdade, desaguando no Rossio, onde fortalecerá o encontro marcado pela Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses [CGTP], previsto para o local.

No entender da ‘Plataforma 15 de Outubro’, a democracia está moribunda e deixou de servir os cidadãos, os seus representantes fingem não ouvir as vozes na rua e procuram silenciar quem exerce o seu direito básico de protesto. Por isso, o propósito de fazer parar a produção no próximo dia 24 de Novembro é uma forma de combater os ‘senhores’ que lucram com a miséria e impõem uma austeridade que ‘os’ faz enriquecer, cada vez mais.

Mas, fazer greve não é ficar em casa - é sair à rua e, enquanto pára o país, fazer ouvir a voz do descontentamento! Porque o governo defende que o país tem de empobrecer, que os cidadãos têm de emigrar, que pagar a dívida é o objectivo único de uma economia em queda e que a alternativa a esse cenário seria a ruína do país.

As medidas de brutalidade deste governo prometem destruir centenas de milhares de postos de trabalho e destruir os direitos daqueles que ainda trabalham, factos que fazem reclamar pelo direito ao trabalho com direitos, pela suspensão do pagamento da dívida, pela execução de uma auditoria cidadã à mesma e pelo direito a manter o 13.º e o 14.º salários.

No dia 15 de Outubro, em Assembleia Popular frente ao parlamento, foi feito um apelo às centrais sindicais para a convocação de uma Greve Geral. A resposta foi afirmativa. Dia 24 de Novembro, a ‘Plataforma 15 de Outubro’ apela ao povo português que se junte, que pare o país, que se manifeste, que faça uma verdadeira Greve Social, onde trabalhadores desempregados caminhem ao lado de trabalhadoras efectivas, onde reformadas caminhem ao lado de trabalhadores precários, onde imigrantes caminhem ao lado de estudantes.

Façamos ouvir a nossa voz! A Democracia está em causa. É hora de lutar!

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

É fartar vilanagem!



O antigo Hospital de Cascais está desactivado desde final de Fevereiro de 2010, após ter sido substituído por um novo, mas continua a ter um conselho de administração, composto por dois elementos, que auferem em conjunto seis mil euros ilíquidos, e mais 16 médicos e técnicos de diagnóstico e terapêutica, que o grupo privado que o substituiu não quis, e que continuaram a ser remunerados sem exercerem funções. Refere-se que os administradores têm estado a tratar da liquidação do que resta do património da unidade integrada no Centro Hospitalar de Cascais, entidade que ainda existe, apesar de não ter doentes há muito.

Mas a tarefa de fechar e extinguir ou vender aos privados (Hospital Ortopédico Dr. José de Almeida, em Carcavelos, também fechado e que foi vendido a uma empresa privada do sector) não fica por aqui. Os cortes na saúde com encerramento de centros de saúde ou diminuição da sua actividade levou dezenas de utentes a protestar com a invasão de da sede da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo porque… só na capital há um milhão de cidadãos sem médico de família.

Enquanto, por um lado, se encerra hospitais e se paga a funcionários para nada fazerem ou se malbaratam milhares de euros em horas extraordinárias (caso do neurologista do H. Santa Maria embolsou cerca de meio milhão de euros por se considerar "imprescindível"!), pelo outro, os enfermeiros continuam a ser despedidos ou então obrigados a emigrar, seguindo as palavras provocatórias e reles do secretário de estado da Juventude e Desportos. O Estado, os cidadãos investem milhões na formação de técnicos para que estes depois vendam o seu saber no estrangeiro, contribuindo para o empobrecimento do país. É a lógica de empobrecer o povo português para enriquecer o “país” (os banqueiros e outros ditos “grandes empresários”), como também bem refere o primeiro-ministro de Portugal (ou da troika?).

«Cem enfermeiros do Hospital S. João, Porto, estão a perder o emprego por não verem renovados os seus contratos, denunciou esta terça-feira o Sindicato dos Enfermeiros Portugueses, mas a administração da unidade só confirma nove» - é a notícia. Pergunta-se o que fizeram os sindicatos, não apenas o SEP, no tempo da senhora-doutora-que-até-ouvia-os-enfermeiros no sentido de empregar todos os enfermeiros e acabar com a precariedade? Nada! Agora muito menos por razões que não deviam ser óbvias.

As administrações hospitalares estão muitíssimo pouco interessadas em saber se com a diminuição do número de enfermeiros a taxa de infecção suba ou a qualidade global dos cuidados prestados desça. O que lhes interessa é, como a comissão liquidatária constituída pelos dois administradores do Centro Hospitalar de Cascais, é liquidar e manter o que sobrar a custos baixos. O que está em causa é, como diz a fonte sindical, é o despacho 12.083/2011, de 15 de Setembro, dos ministérios das Finanças e da Saúde, que obriga os hospitais a enviarem às administrações regionais de saúde e esta ao Ministério da Saúde "informação detalhada e casuística" que demonstre a imprescindibilidade de contratação ou renovação de contratos.

E para o que o governo pretende parece que até há enfermeiros a mais no SNS, porque a seguir virão as extinções, as fusões, ou seja, a diminuição da oferta pelo Estado para abrir ainda mais mercado às empresas privadas que operam ou venham a operar neste campo de actividade: a saúde (ou doença, conforme a perspectiva); negócio que já foi apontado como o negócio do século neste jardim á beira-mar plantado. O desemprego pressiona a descida dos salários, ou seja, os custos de trabalho, nem é preciso ser economista ou dirigente sindical para saber isso e perceber os intuitos ocultos deste governo.

Com o roubo de 5% em média dos nossos salários e parte substancial do 13º mês, este ano, e dos mesmos 5% e mais os 13º e 14º meses para o ano, o que levará a uma diminuição de mais de 25% do nosso rendimento, adicionado ao desemprego e precariedade na profissão, são razões mais que suficientes para se provocar uma enorme convulsão social. Mas os nossos queridos sindicatos e mais amados dirigentes, que se vão anti-democraticamente perpetuando no poder (tacho sindical) até ultrapassar a idade da reforma, deveriam dirigir a revolta, contudo, e para manter a tradição, não desejam o fim do “eldorado” dos governos da troika e da dívida soberana e… do tacho sindical (daí a sua “admirável” sobrevivência). Nós enfermeiros teremos que os sustentar a todos, é uma sina! Até quando?...

sábado, 12 de novembro de 2011

Petição Em defesa da democracia, da equidade e dos serviços públicos


Henricartoon

Para:Assembleia da República

Excelentíssima Senhora Presidente da Assembleia da República,

Nos termos e para os efeitos previstos no artigo 52º da Constituição e na Lei nº 43/90, de 10 de Agosto, com as alterações introduzidas pelas Lei nº 6/93, de 1 de Março, Lei nº 15/2003, de 4 de Junho, e Lei nº 45/07, de 24 de Agosto, os cidadãos abaixo-assinados, incluindo a identificação completa do primeiro signatário, apresentam à Assembleia da República a seguinte petição.

As medidas extraordinárias inscritas na Proposta de Lei de Orçamento de Estado para 2012 põem em causa alguns dos princípios fundamentais do governo democrático e do Estado de Direito, porque contrariam em absoluto vários compromissos eleitorais fundamentais, bem como a necessária igualdade e justiça de tratamento dos portugueses, a qualidade dos serviços públicos e a motivação dos seus servidores.

Essas medidas, que comprimem brutalmente o nível de vida dos portugueses, são múltiplas: a eliminação dos subsídios de férias e de Natal dos servidores públicos e dos pensionistas, em 2012 e 2013; a eliminação das promoções e progressões na carreira, bem como o corte de salários (entre 5 e 10 por cento), apenas para a função pública (FP); o aumento de meia hora de trabalho diário para o sector privado; o brutal aumento da carga fiscal, sobretudo sobre consumidores e assalariados, ampliando o fosso de rendimentos entre capital e trabalho e as desigualdades sociais, num dos países mais desiguais da UE.

Os signatários reconhecem a necessidade de medidas de austeridade para o saneamento das finanças públicas e que a redução do défice se faça prioritariamente do lado da despesa. Porém, aquelas medidas são excessivas e iníquas e, não estando inscritas no memorandum, podem por isso ser alteradas em sede parlamentar sem pôr em causa uma necessária trajectória de consolidação orçamental.

Especificamente, ou o corte de salários e subsídios é definitivo, mas nessa altura ofende a Constituição, por significar uma restrição brutal, desproporcionada, desrazoável, não indispensável e não suficientemente justificada dos direitos à retribuição e à segurança social, ou é transitório, sendo então equivalente a um imposto extraordinário embora contabilizado como um corte de despesa. Mas, neste caso, viola o princípio constitucional da igualdade por pretender resolver uma dificuldade conjuntural, de natureza e responsabilidade nacionais, à custa de um encargo gravíssimo incidindo exclusivamente sobre uma parte dos portugueses em função da sua situação económica e condição social.

Ao “tributar” fundamentalmente os quadros médios e superiores do Estado, o Governo está a desmotivar uns e a incentivar outros à saída, além da violência psicológica e da punição que isso significa sobre milhares de quadros e funcionários competentes e dedicados ao serviço público durante décadas. O Estado ficará mais fragilizado, mais incapacitado de servir o interesse público através da prestação de serviços jurídicos, de educação, de saúde, de ação social, entre outros.

Por tudo isto, os subscritores desta petição requerem uma alargada discussão pública e a aprovação em sede de especialidade na Assembleia da República e na votação final global, de medidas alternativas às que geram maiores inequidades e que constam da actual Proposta de Lei de Orçamento do Estado para 2012. Solicitam ainda à Assembleia da República que interceda junto do Governo da República para uma renegociação de certos aspectos do memorando da “troika “ obviamente irrealistas.
Nesse sentido, apelam a todos os grupos parlamentares que procurem soluções mais consensuais e universais que, não pondo em causa a consolidação orçamental, promovam o crescimento, o emprego, a solidariedade social e, simultaneamente, valorizem a qualidade dos serviços públicos e a dignidade e a motivação dos seus profissionais. Desta forma não se poria em causa a Constituição da República Portuguesa e a qualidade da democracia alicerçada na equidade de tratamento entre todos os portugueses.

Por requisito legal: Identificação do primeiro Peticionário

André Renato Leonardo Neves dos Santos Freire, morador na Estrada de Benfica nº 446, 2º Frente, 1500-103 em Lisboa e portador do Bilhete de Identidade numero 5510161.

Os signatários

ASSINAR
Excelentíssima Senhora Presidente da Assembleia da República,

Nos termos e para os efeitos previstos no artigo 52º da Constituição e na Lei nº 43/90, de 10 de Agosto, com as alterações introduzidas pelas Lei nº 6/93, de 1 de Março, Lei nº 15/2003, de 4 de Junho, e Lei nº 45/07, de 24 de Agosto, os cidadãos abaixo-assinados, incluindo a identificação completa do primeiro signatário, apresentam à Assembleia da República a seguinte petição.

As medidas extraordinárias inscritas na Proposta de Lei de Orçamento de Estado para 2012 põem em causa alguns dos princípios fundamentais do governo democrático e do Estado de Direito, porque contrariam em absoluto vários compromissos eleitorais fundamentais, bem como a necessária igualdade e justiça de tratamento dos portugueses, a qualidade dos serviços públicos e a motivação dos seus servidores.

Essas medidas, que comprimem brutalmente o nível de vida dos portugueses, são múltiplas: a eliminação dos subsídios de férias e de Natal dos servidores públicos e dos pensionistas, em 2012 e 2013; a eliminação das promoções e progressões na carreira, bem como o corte de salários (entre 5 e 10 por cento), apenas para a função pública (FP); o aumento de meia hora de trabalho diário para o sector privado; o brutal aumento da carga fiscal, sobretudo sobre consumidores e assalariados, ampliando o fosso de rendimentos entre capital e trabalho e as desigualdades sociais, num dos países mais desiguais da UE.

Os signatários reconhecem a necessidade de medidas de austeridade para o saneamento das finanças públicas e que a redução do défice se faça prioritariamente do lado da despesa. Porém, aquelas medidas são excessivas e iníquas e, não estando inscritas no memorandum, podem por isso ser alteradas em sede parlamentar sem pôr em causa uma necessária trajectória de consolidação orçamental.

Especificamente, ou o corte de salários e subsídios é definitivo, mas nessa altura ofende a Constituição, por significar uma restrição brutal, desproporcionada, desrazoável, não indispensável e não suficientemente justificada dos direitos à retribuição e à segurança social, ou é transitório, sendo então equivalente a um imposto extraordinário embora contabilizado como um corte de despesa. Mas, neste caso, viola o princípio constitucional da igualdade por pretender resolver uma dificuldade conjuntural, de natureza e responsabilidade nacionais, à custa de um encargo gravíssimo incidindo exclusivamente sobre uma parte dos portugueses em função da sua situação económica e condição social.

Ao “tributar” fundamentalmente os quadros médios e superiores do Estado, o Governo está a desmotivar uns e a incentivar outros à saída, além da violência psicológica e da punição que isso significa sobre milhares de quadros e funcionários competentes e dedicados ao serviço público durante décadas. O Estado ficará mais fragilizado, mais incapacitado de servir o interesse público através da prestação de serviços jurídicos, de educação, de saúde, de ação social, entre outros.

Por tudo isto, os subscritores desta petição requerem uma alargada discussão pública e a aprovação em sede de especialidade na Assembleia da República e na votação final global, de medidas alternativas às que geram maiores inequidades e que constam da actual Proposta de Lei de Orçamento do Estado para 2012. Solicitam ainda à Assembleia da República que interceda junto do Governo da República para uma renegociação de certos aspectos do memorando da “troika “ obviamente irrealistas
Nesse sentido, apelam a todos os grupos parlamentares que procurem soluções mais consensuais e universais que, não pondo em causa a consolidação orçamental, promovam o crescimento, o emprego, a solidariedade social e, simultaneamente, valorizem a qualidade dos serviços públicos e a dignidade e a motivação dos seus profissionais. Desta forma não se poria em causa a Constituição da República Portuguesa e a qualidade da democracia alicerçada na equidade de tratamento entre todos os portugueses.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Os trabalhadores estão na rua!


No sábado mais de 150 mil cidadãos saíram à rua mostrando a sua indignação (e REVOLTA) pelas medidas gravosas contidas na proposta de Orçamento do Estado para 2012. As palavras de ordem foram variadas: “não somos mercadoria nas mãos dos banqueiros”, “a precariedade não é inevitável”, “eles é que vivem acima das suas possibilidades”, “austeridade não é solução”, “contra o capital”, “não esbanjamos, não pagamos”, “nova geração, novo Abril”, “troika fora de Portugal”, “façamos como a Grécia, greve geral”, “suspensão do pagamento da dívida”, etc.

As centrais sindicais estiveram caladas e só quando os trabalhadores saíram à rua é que tentam acordar uma data para a greve geral, que esperamos que não seja como a última que se limitou a marcar o ponto. E onde está o SEP durante este tempo de luta se há milhares de enfermeiros desempregados, precários ou obrigados a trabalhar com horários prolongados e a ganhar abaixo do estipulado pela lei? Carvalho da Silva, e temos que fazer justiça, esteve presente.

À dívida, de que tanto se fala e que é apresentada como a razão principal das medidas apresentadas pelo governo, deve ser feita uma auditoria pública e independente, e se se chegar à conclusão de que é ilegítima, então, não deve ser paga; e até lá a suspensão do pagamento deve ser imediata. No entanto, sabemos que, durante o dia de Sábado, o PCP mandou os militantes para as sedes a fazer reuniões impedindo-os de se juntar às manifestações, e foi onde estiveram os principais dirigentes do SEP, pela simples razão de que este partido é a favor do pagamento de uma dívida que não foi contraída pelos trabalhadores nem reverteu a seu favor.

Mas também fazemos a pergunta: e os outros dirigentes sindicais, dos sindicatos afectos à UGT, estiveram em casa a rezar para que este governo se aguente os 4 anos? Olhem que a história diz-nos que os governos de coligação em Portugal nunca chegam ao fim da legislatura. E a este devemos fazer os possíveis para que tenha uma vida bem breve.

Com outros dirigentes sindicais que desde os PECs dos governos anteriores que a luta já se tinha iniciado de forma contínua e que, agora com estas medidas, estaríamos há muito na rua e na ocupação dos locais de trabalho numa autêntica sublevação. Mas parece que estão em catalepsia e, por outro lado, muitos trabalhadores da administração pública, onde se inclui a grande maioria dos enfermeiros, parecem que ainda não interiorizam a gravidade das medidas agora anunciadas:

corte (roubo) de 5% dos salários que passam deste ano para o ano que vem (os trabalhadores e pensionistas irão pagar ainda este ano mais 800 milhões € de IRS); corte (roubo) de parte do subsídio de natal este ano; corte (roubo) dos subsídios de férias e de natal em 2012 e 2013 (que se manterão no futuro tal como os 5% deste ano), que serão 952,6 milhões por ano acrescidos à perda de 14% do nosso poder de compra (no final cerca de 25%); corte (roubo) dos mesmos subsídios aos pensionistas (1.682 milhões euros por ano); mais meia hora de trabalho por dia aos trabalhadores do sector privado (7.002.681.382 de euros). Tudo para aumentar os lucros dos patrões e recapitalizar a banca, que já recebe 12 mil milhões e que iremos também pagar.

Com sindicatos a sério, defensores dos trabalhadores, já teríamos uma revolta social também a sério. É pela prática que se afere do verdadeiro posicionamento de quem se diz defensor dos trabalhadores. E os factos demonstram que estes dirigentes sindicais (de todos os sindicatos dos enfermeiros) não estão na barricada dos trabalhadores que dizem representar.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

manifesto - 15 de Outubro


Em adesão ao protesto internacional convocado pelos movimentos 'indignados' e 'democracia real ya', em Espanha, ocorrerá, no Porto (e em mais seis cidades), uma manifestação sob o tema 'a democracia sai à rua', no dia 15 de Outubro de 2011. As razões que nos levam para a rua são muitas e diferentes, de pessoa para pessoa, de país para país - não querendo fechar o protesto a outras exigências de liberdade e de democracia, mas para que se saiba porque saimos para a rua, tentámos, entre os que estão a ajudar na organização e na divulgação do 15 de outubro, encontrar as reivindicações que nos são comuns - entre nós e relativamente aos outros gritos das outras praças, nas ruas de todo o mundo:

Dos EUA a Bruxelas, da Grécia à Bolívia, da Espanha à Tunísia, a crise do capitalismo acentua-se. Os causadores da crise impõem as receitas para a sua superação: transferir fundos públicos para entidades financeiras privadas e, enquanto isso, fazer-nos pagar a factura através de planos de pretenso resgate. Na UE, os ataques dos mercados financeiros sobre as dívidas soberanas chantageiam governos cobardes e sequestram parlamentos, que adoptam medidas injustas, de costas voltadas para os seus povos. As instituições europeias, longe de tomar decisões políticas firmes frente aos ataques dos mercados financeiros, alinham com eles.

Desde o começo desta crise assistimos à tentativa de conversão de dívida privada em dívida pública, num exemplo de nacionalização dos prejuízos, após terem sido privatizados os lucros. Os altos juros impostos ao financiamento dos nossos países não derivam de nenhuma dúvida sobre a nossa solvência, mas sim das manobras especulativas que as grandes corporações financeiras, em conivência com as agências de rating, realizam para se enriquecerem. Os cortes económicos vêm acompanhados de restrições às liberdades democráticas - entre elas, as medidas de controlo sobre a livre circulação dos europeus na UE e a expulsão das populações migrantes. Apenas os capitais especulativos têm as fronteiras abertas. Estamos submetidos a uma mentira colectiva.

A dívida privada é bem maior que a dívida pública e a crise deve-se a um processo de desindustrialização e de políticas irresponsáveis dos sucessivos governos e não a um povo que "vive acima das suas possibilidades" – o povo, esse, vê diariamente os seus direitos e património agredidos. Pelo contrário, o sector privado financeiro - maior beneficiário da especulação - em vez de lhe aplicarem medidas de austeridade, vê o seu regime de excepção erigido. As políticas de ajuste estrutural que se estão a implementar não nos vão tirar da crise – vão aprofundá-la. Arrastam-nos a uma situação limite que implica resgates aos bancos credores, resgates esses que são na realidade sequestros da nossa liberdade e dos nossos direitos, das nossas economias familiares e do nosso património público e comum. É preciso indignarmo-nos e revoltarmo-nos ante semelhantes abusos de poder.

Em Portugal, foi imposto como única saída o memorando da troika – têm-nos dito que os cortes, a austeridade e os novos impostos à população são sacrifícios necessários para fazer o país sair da crise e para fazer diminuir a dívida. Estão a mentir! A cada dia tomam novas medidas, cortam ou congelam salários, o desemprego dispara, as pessoas emigram. E a dívida não pára de aumentar, porque os novos empréstimos destinam-se a pagar os enormes juros aos credores – o déficit dos países do sul europeu torna-se o lucro dos bancos dos países ricos do norte. Destroem a nossa economia para vender a terra e os bens públicos a preço de saldo.

Não são os salários e as pensões os responsáveis pelo crescer da dívida. Os responsáveis são as transferências de capital público para o sector financeiro, a especulação bolsista e as grandes corporações e empresas que não pagam impostos. Precisamos de incentivos à criação de emprego e da subida do salário mínimo (em Portugal o salário mínimo são 485€, e desde 2006 duplicou o número de trabalhadores que ganham apenas o salário mínimo) para sairmos do ciclo recessivo.

Por isso, nós dizemos:

- retirem o memorando. vão embora. não queremos o governo do FMI e da troika!
- nacionalização da banca – com os planos de resgate, o estado tem pago à banca para especular
- abram as contas da dívida – queremos saber para onde foi o dinheiro
- não ao pagamento da dívida ilegítima. esta dívida não é nossa – não devemos nada, não vendemos nada, não vamos pagar nada!
- queremos ver redistribuídas radicalmente as riquezas e a política fiscal mudada, para fazer pagar mais a quem mais tem: aos banqueiros, ao capital e aos que não pagam impostos.
- queremos o controlo popular democrático sobre a economia e a produção.
- não queremos a privatização da água, nem os aumentos nos preços dos transportes públicos, nem o aumento do IVA na electricidade e no gás.
- queremos trabalho com direitos, zero precários na função pública (em Portugal o maior contratador de precários é o estado), a fiscalização efectiva do cumprimento das leis laborais e o aumento do salário mínimo.
- queremos ver assegurados gratuitamente e com qualidade os direitos fundamentais: saúde, educação, justiça.
- queremos o fim dos ajustes directos na administração pública e transparência nos concursos para admissão de pessoal, bem como nas obras e aquisições do estado.
- queremos mais democracia:
- queremos a eleição directa de todos os representantes cargos públicos, políticos e económicos: dos responsáveis pelo Banco de Portugal ao Banco Central Europeu, da Comissão Europeia ao Procurador Geral da República
- queremos mais transparência no processo democrático: que os partidos apresentem a eleições, não somente os programas mas também as equipas governativas propostas à votação.
- queremos mandatos revogáveis nos cargos públicos - os representantes são eleitos para cumprirem um programa, pelo que queremos que seja criada uma forma democrática para revogação de mandato em caso de incumprimento do mesmo programa;

Partilha esta informação, participa na divulgação do protesto. (http://15out-porto.blogspot.com/ )
Vem para a rua fazer ouvir a tua voz. Dia 15, às 15h, em Porto, Lisboa, Angra do Heroísmo, Évora, Faro, Braga, Coimbra.

Cortar, cortar… é a palavra de ordem


O Orçamento do Estado para 2012, que vai ser aprovado em Conselho de Ministros extraordinário na próxima segunda-feira, prevê um corte de 1.400 milhões de euros só nos ministérios da Saúde e Educação. E «o orçamento da Saúde é o que vai levar o maior corte: são menos 800 milhões do que no ano passado». Segundo o jornal "Económico”.

O ministro já fez saber que os cortes serão nas horas extraordinárias, meios de diagnósticos, comparticipação de medicamentos e desperdícios. «Só no Serviço Nacional de Saúde o Governo pretende cortar cerca de 600 milhões de euros.» Os cortes, segundo o ministro, serão nas ditas “gorduras do Estado”. Mas, na realidade, não será bem o caso porque os contratos público privados na área da saúde vão de vento em popa, com claro prejuízo para os cofres públicos, e não se consegue esconder que a se continua com a destruição do SNS, através da sua desorçamentação, para se entregar grande parte dos cuidados de saúde aos privados.

Os partidos da oposição vieram logo a terreiro condenar estes cortes cegos na saúde, o PCP através de intervenção contundente na Assembleia da República, e o PS, pela voz de Carlos Zorrinho, contrapôs que essa "não é a filosofia do ajustamento estrutural preconizado pelo PS", esquecendo que os seus governos, liderados por Sócrates, foram os que mais fizeram pelo desmantelamento do SNS, com o encerramento de serviços de urgência e das maternidades, congelamento das progressões nas carreiras dos trabalhadores do sector, pelos cortes salariais e pela vergonhosa carreira dos enfermeiros, cujos salários têm vindo a encolher desde há sete/oito anos.

O PS já disse que irá aprovar o Orçamento do Estado para 2012 porque está em causa o dito “interesse nacional”.

O “interesse nacional” irá estar bem acautelado no próximo orçamento, na perspectiva dos partidos que assinaram o memorando de entendimento com a troika, com aumento dos impostos, fim das deduções em sede de IRS, actualização das taxas moderadores, mais cortes salariais nos trabalhadores do estado, congelamento das pensões de reforma, privatização das empresas públicas (CTT e transportes serão as primeiras) com despedimento de centenas de trabalhadores, revisão da legislação laboral, onde se inclui aumento dos horários de trabalho, mais facilidade de despedimentos, mais flexibilidade, mais precariedade, etc.

Nós, enfermeiros, estamos já apanhar por tabela, com mais precariedade, salários nominais diminuídos, mais flexibilidade e uma carreira profissional sem futuro. Encontram-se mais que reunidas as condições para nos revoltarmos. Devemos seguir a desobediência civil e prepararmos para enviar este governo, o mais depressa possível, pelo caminho do anterior, antes que fiquemos na mais completa miséria.

PS: 12 mil milhões de euros vão directamente para os bolsos dos banqueiros, que declaram milhões de lucros por dia, e o governo prepara-se para lhes enfiar mais 35 mil milhões por meio de avales. E o governo grego, que diz não ter dinheiro para pagar os salários aos funcionários públicos, já tem alguns milhares de milhões para comprar tanques para defender os bancos da revolta do povo. E esta, hei!

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Os que se valem da profissão


A notícia recente que está a chocar a opinião pública e que tem sido aproveitada por todos os canais de televisão nos seus programas de entretenimento do Zé Povinho, género Você na TV! do Goucha, é a do polícia que, valendo-se da profissão e contando com a cumplicidade de um colega, montou uma cilada a um vizinho com quem estava em conflito enfiando-o na prisão durante cinco meses, agora está a contas com a justiça e com procedimento disciplinar dentro da PSP. E iremos lá ver se será castigado pelo que fez, como aconteceria se tratasse de um simples e qualquer cidadão!

Situação que se pode comparar, de certo modo, com a de médicos que, aproveitando-se da profissão e do estatuto social privilegiado, vão cometendo algumas tropelias: há tempos tivemos o psiquiatra que violou uma doente grávida no consultório; agora é o caso do médico neurocirurgião que espreitou as colegas e as enfermeiras na casa de banho, utilizando um sistema de microcâmara controlado à distância; e de outro clínico, cirurgião vascular, que acaba de ser acusado pelo Ministério Público de 15 crimes de abuso sexual de pessoa internada, em concurso com a prática de 15 crimes de coação sexual, segundo o divulgado pela Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa.
No caso do neurocirurgião do Hospital de Viseu, a imprensa já referiu que é cidadão brasileiro, dando a entender que se fosse português a coisa não teria acontecido. No segundo caso, a prática do crime foi continuada ao longo de alguns anos, entre 2005 e 2010, praticando o médico atos sexuais de relevo com as 15 ofendidas identificadas, fazendo-o de diversas formas, designadamente antes das cirurgias, após as cirurgias, durante os tratamentos e ainda nas consultas de clínica privada.

Quanto ao cirurgião vascular, a Inspeção-Geral da Administração de Saúde (IGAS) interveio e, no âmbito de um processo disciplinar, foi aplicada a pena de demissão de funções públicas e, quanto ao processo crime, o arguido tem como medida de coação a obrigação de permanência na habitação, assim como de proibição de contactos e de prática de atos médicos. Não consta que tenha sido expulso da Ordem. Em relação ao neurocirurgião – que continua a trabalhar no hospital e no mesmo serviço –, os processos, disciplinar e judicial, ainda estão na fase inicial, espera-se pelo que virá, mas não nos parece, atendendo à experiência, que venha a haver castigo de vulto.

Costuma-se dizer que em Portugal há duas justiças: uma para os ricos e poderosos, outra para os pobres e trabalhadores. A primeira é lenta e obsequiosa para permitir que fujam ao castigo devido, a segunda é rápida e implacável a castigar. Os médicos são geralmente julgados pela primeira. Há quem diga (o bastonário da Ordem dos Advogados) que existe ainda uma terceira: para os magistrados e familiares que, inclusivamente, podem matar, que nada lhes acontece. É bem possível que alguns médicos, os mais poderosos e influentes, sejam tratados por esta última.

Ainda quanto à Ordem dos Médicos, tem surgido a acusação de ser responsável pelo atraso da legalização dos nove médicos porto-riquenhos que se encontram desde Maio em Portugal e que, já depois de terem feito a prova de português e a prova técnica e ficarem aprovados, e estarem integrados nos próprios serviços, não têm a cédula profissional, que é passada pela Ordem, por… falta de um documento que deveria ter sido enviado pelo governo da Costa Rica. A acusação é feita pela comissão de utentes de saúde do Médio Tejo e claro que quem perde são os cidadãos utentes que não têm dinheiro para ir ao consultório privado do senhor doutor. Quanto a esta história estamos bem lembrados do tempo em que qualquer enfermeiro recém formado era admitido em qualquer hospital público no dia seguinte à saída da escola e sem necessidade de apresentação de qualquer papel e, tanto quanto se sabe, não consta que tenha havido alguma fraude, mas quando um governo se demite da sua autoridade e deixa que organizações mafiosas se constituam em estados, então é o que acontece.
Estas estórias devem fazer despertar os enfermeiros para a reclamação da sua quota de poder e de autoridade dentro da gestão dos cuidados de saúde, mas sem arrogâncias nem mafiosices, porque a importância da sua função assim o justifica.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Filhos da Guerra


No discurso deste ano do Estado da União, o Presidente Barack Obama declarou que “a guerra do Iraque está a chegar ao fim” – pelo menos para os Americanos, saimos “de cabeça erguida” porque “o nosso compromisso foi cumprido”.

Contudo, para milhões de Iraquianos, a guerra está longe do fim – na verdade, para cada vez mais famílias nas cidades que foram quase destruídas durante os anos de insurgência e contra-insurgência, a crise está só a começar. Como disse um Americano Iraquiano, “ Só porque nós (Norte-americanos) não prestamos atenção, não significa que o resto do mundo não esteja a prestar atenção”.

Segundo estudos e relatos de testemunhas sobre os últimos anos, Faluja – uma cidade iraquiana que foi praticamente eliminada pela artilharia pesada norte-americana em duas grandes ofensivas em 2004 – confronta-se com um número assombroso de defeitos de nascença. A situação faz eco de relatos semelhantes em Bassorá que começaram a aparecer depois da primeira Guerra do Golfo em 1991.

A série de horrores enumerados é confrangedora: bebés que nascem com um olho no meio da cara, sem membros ou com muitos membros, com a cabeça defeituosa, insuficiências cardíacas, e falta de órgãos genitais.

Ao visitar uma clínica em Faluja em Março 2010, John Simpson da BBC disse “ Fomos confrontados com imensos casos de crianças com graves defeitos de nascença… Vi uma fotografia que mostrava um recém-nascido com três cabeças”. Depois, no principal hospital da cidade, fundado pelos EUA, uma quantidade de pessoas chegavam com os seus filhos que tinham membros defeituosos, deformações na coluna e outros problemas. Dizem que as autoridades de Faluja avisavam as mulheres para não quererem de todo ter filhos.

Ayman Qais, director do hospital geral de Faluja, disse ao Guardian que assistia a dois bebés afectados por dia, em comparação com quatro por mês que vira em 2003. “A maior parte (das deformações) são na cabeça e na coluna vertebral, mas também há muitas deficiências nas pernas” disse ele. “Há também um aumento muito acentuado do número de casos de crianças com menos de dois anos com tumores no cérebro.”.

É largamente aceite entre os cientistas, médicos e trabalhadores de ajuda humanitária que a guerra é responsável. A presença de tanto armamento despendido, resíduos e escombros, poços de material queimado nas bases dos EUA e incêndios de poços de petróleo deixaram um legado tóxico que está a envenenar o ar, a água e o solo do Iraque.

“Eu penso que nós destruímos o Iraque” diz Adil Shamoo, bioquímico da Universidade de Maryland que se especializou em ética médica e política externa.

Shamoo, um americano iraquiano acredita que é “do senso comum” associar os problemas de saúde do Iraque aos bombardeamentos implacáveis das suas cidades e vilas e a poluição resultante dos combates e da ocupação.

O Departamento da Defesa discorda, e rejeita as reclamações de que o exército seja responsável das doenças crónicas, defeitos de nascença e altas taxas de cancro entre a população local e os seus próprios membros que estiveram expostos aos mesmos elementos. Os responsáveis da Defesa não atendiam telefonemas nem respondiam aos e-mails para comentar as questões levantadas nesta matéria.

O governo iraquiano pouco tem feito para resolver a crise de saúde pública em Faluja e noutros lugares. As autoridades não podem deixar, e aparentemente falta vontade, de acabar com a poluição que assola em torno dos centros populacionais do país, até porque muitos iraquianos continuam a reclamar o abastecimento de água potável e assistência médica básica.

Um estudo conjunto feito em 2010 pelos ministérios do ambiente, da saúde e ciência, encontrou 42 locais que estavam contaminados com altos níveis de radiação e dioxinas – resíduos, assegura aquele estudo, originados por três décadas de guerra. Os críticos acreditam que há centenas de outros locais como estes.

As áreas em volta dos centros urbanos como Faluja e Bassorá representam 25% dos locais contaminados. A poluição em Bassorá data de pelo menos 1982, quando a Operação de Ramadan, a maior batalha da guerra Irão-Iraque – na qual os EUA deram a Saddam Hussein biliões de dólares em armas, instrução e outros apoios – sacudiu o deserto. Nos 20 anos após a primeira Guerra do Golfo, Bassorá tem visto uma aumento acentuado de doenças prevalentes na infância. Segundo os investigadores da Escola de Saúde Pública da Universidade de Washington, a taxa de leucemia infantil mais do que duplicou em Bassorá entre 1993 e 2007.

Em Dezembro, um relatório publicado no Jornal Internacional de Pesquisa Ambiental e Saúde Pública declarava que desde 2003 foram observadas “malformações congénitas” em 15% do total de nascimentos em Faluja. Insuficiências cardíacas eram as mais frequentes, seguidas por deficiências no canal neural, que causam deformidades irreversíveis e muitas vezes fatais. Em comparação, a maioria dos defeitos de nascença afectam apenas aproximadamente 3% dos recém-nascidos nos EUA e uma média de 6% em todo o mundo.

“ O timing em que ocorreram os defeitos de nascença indica que eles podem estar relacionados com a guerra associada a longo período de exposição à contaminação” afirma o relatório. “Muitos contaminantes que se produzem na guerra têm a capacidade de interferir no desenvolvimento embrionário e fetal normal.”

Outro artigo recente, “Cancro, Mortalidade Infantil e Proporção de Sexos nos Nascimentos em Faluja, Iraque 2005-2009”, publicado no Jornal Internacional de Pesquisa Ambiental e Saúde Pública em Julho 2010, baseou-se numa inquérito porta a porta a 4.843 habitantes em 711 casas de Faluja. Reconhecendo que estes inquéritos têm algumas limitações, os autores destacaram três conclusões convincentes, incluindo uma redução de 18% dos nascimentos do sexo masculino após 2004 e um aumento da mortalidade infantil.

“As conclusões aqui reportadas não lançam qualquer luz sobre quem são os agentes causadores do aumento dos níveis de doenças e embora estejamos atentos ao uso do urânio empobrecido como uma potencial causa relevante, pode haver outras possibilidades”, escrevem os autores.

Na verdade, há muitos outros possíveis contaminantes – mas o urânio empobrecido tem sido o principal suspeito.

O urânio empobrecido (DU) é um metal radioactivo de alta densidade a altamente tóxico que os militares usam regularmente pelas suas capacidades de blindagem e de penetração. Os tanques Abrams e carros de combate Bradley do exército usam-no na sua armadura e nas suas munições.

Além das capacidades de penetração de longo alcance, as armas munidas de DU causam mais danos porque lançam num instante os alvos em chamas.

Depois das batalhas, as carcaças dos tanques e os restos das munições de DU que explodiram ou não, produzem radiação, enquanto minúsculas partículas do metal pesado se introduzem no pó e podem girar no ar a longas distâncias. Este pó pode ser mortal quando inalado, dizem médicos e ambientalistas.

Os EUA deixaram cerca de 320 toneladas de DU no campo de batalha depois da primeira Guerra do Golfo. As rajadas de DU deram uma clara vantagem sobre os Iraquianos, destruindo uns 4.000 tanques, muitos dos quais continuam a poluir a paisagem do deserto. “As partículas invisíveis formadas quando as granadas batiam e se incendiavam, ainda estão ‘a arder’. Elas fazem zumbir os detectores Geiger e metem-se nos tanques, contaminando o solo e espalhando-se com o vento do deserto, como será durante os 4,5 biliões de anos que levará o DU a perder apenas metade da sua radioactividade”, escreveu Scott Peterson no Christian Science Monitor.

Num outro artigo, Peterson documentou provas de DU em Bagdade, examinando “pontos quentes” à volta dos detritos de batalhas, com um detector Geiger. Ele comentou que a Força Aérea admitira que os aviões A-10 “Warthog” tinham atirado 300.000 rajadas durante a fase da invasão “choque e pavor”.

“Não disseram às crianças para não brincarem com os detritos radioactivos” escreveu Peterson. Ele viu apenas um local onde as tropas norte-americanas colocaram avisos escritos em árabe para os iraquianos se afastarem. “Ali foi encontrado um dardo de DU com 3 pés de comprimento, de uma granada de 120 mm, produzindo radiação 1.300 vezes superior aos níveis encontrados anteriormente. (O detector Geiger) fez os sons das explosões transformarem-se num gemido constante.”

Tem sido impossível obter um retrato exacto de como o DU foi usado pelas forças norte-americanas no Iraque desde 2003. Em 14 Março 2003, numa conferência de imprensa, menos de uma semana antes da invasão, o Coronel James Naughton do Comando do Equipamento do Exército dos EUA vangloriou-se que os Iraquianos “querem que (o DU) fique de fora, porque senão nós limpávamos – lhes o sebo” nas batalhas de tanques de 1991. “ De facto os seus soldados não podem ficar satisfeitos com a ideia de saírem basicamente nos mesmos tanques com alguns ligeiros melhoramentos e usarem outra vez os Abrams.”

A bazófia parou depois do “choque e pavor”. As autoridades agora insistem que a exposição ao DU não é responsável pelos graves problemas de saúde do Iraque. Confrontado com as provas dos defeitos de nascença em Faluja, o porta-voz do Pentágono Michael Kilpatrick disse o ano passado à BBC, “Até à data nenhum estudo indicou que as questões ambientais tenham resultado em problemas de saúde específicos”.

A composição exacta das munições usadas durante os combates em Faluja no final de 2004, continua sem se conhecer. Mas a escala da poluição pode ser medida pela magnitude dos bombardeamentos. Segundo Rebecca Grant, ao escrever para a Air Force Magazine em 2005, os EUA levaram a cabo implacáveis bombardeamentos na primeira batalha de Faluja, de Março a Setembro de 2004 e lançaram uma segunda ofensiva nesse Novembro.

Grant descreve um “ritmo constante de bombardeamentos” numa caça ao homem quase toda urbana, empregando helicópteros AC-130 e aeronaves de asa-fixa , mesmo depois de logo no início, os comandantes serem avisados para reduzirem a escala dos ataques devido a considerações políticas sobre os danos colaterais. Os aviões F-15 desciam a pique e metralhavam insurgentes a preparar abrigos enquanto os marines eram chamados a atacarem os insurgentes encurralados, com mísseis guiados por GPS, como os novos GBU-38 JDAM (Joint Direct Attack Munition) de 500 libras de peso, que podiam “arrancar” edifícios mesmo do meio de zonas muito povoadas.

A descrição de Grant não inclui o uso de DU nem de fósforo branco que em contacto com a carne humana a faz fritar até ao osso. Um ano após os médicos de Faluja começarem a relatar as queimaduras denunciantes, um porta-voz do Pentágono admitiu à BBC que aquele fósforo branco era de facto “usado como arma incendiária contra os combatentes inimigos” em 2004. Inicialmente, o exército afirmara que era usado apenas para iluminação do campo de batalha.

“Quando entravam, basicamente arrancavam todos os stops”, disse o jornalista de investigação Dahr Jamail, que em 2004 esteve em Faluja.

O problema com a tentativa de identificar um agente básico dos defeitos de nascença no Iraque é que o país é um caldeirão de contaminação. Além da água poluída, há em toda a parte colunas de fumos tóxicos de queima de resíduos nas bases dos EUA, assim como fogos de petróleo e gás que salpicam a paisagem. Não menos do que 469 ocorrências de incêndios de petróleo e gás, a maioria explosões de oleodutos causadas por insurgentes, foram registadas entre 2003 e 2008.

Saddam Hussein usou armas químicas contra o seu povo e alegadamente ordenou aos seus homens – fugindo da invasão de 2003 – sabotar a velha estação de tratamento de água de Qarmat Ali, ao norte de Bassorá onde os rios Tigre e Eufrates se encontram. A teoria manipulada é que eles usaram um pó anti corrosivo contendo enormes quantidades de crómio de potência seis, um químico conhecido por causar cancro.

Alguns dos soldados da Guarda Nacional Oregon que mais tarde trabalharam e viveram na estação - convencidos pela segurança dos empreiteiros Kellog, Brown and Root que Qarmat Ali estava a salvo – estão agora tão doentes que mal podem andar. “Este é o nosso Agente Laranja” disse o veterano Scott Ashby ao The Oregonian em 2009, referindo-se ao herbicida pulverizado pelas forças dos EUA sobre enormes áreas do campo Vietnamita de 1961 a 1971.

A comparação com o Agente Laranja é adequada. Como no Vietname uma geração antes, os Norte-americanos correram para as saídas emocionais no Iraque, riscando a guerra como se fosse um engano, melhor se retiravam dos livros de história. Ignorando o lamento constante dos seus virtuosos detectores Geiger, o público dos EUA arruma ordenadamente as fotografias de bebés iraquianos deformados junto das desbotadas memórias das crianças vietnamitas e veteranos americanos marcados com cicatrizes por produtos químicos no campo de batalha. A negação colectiva tornou-se no melhor amigo do império, como o desastre da política externa do Sudeste Asiático deu lugar a uma catástrofe de 30 anos no Médio Oriente.

(Original em www.uruknet.info?p=79555 e http://tribunaliraque.info/pagina/artigos/depoimentos.html?artigo=997)

sábado, 24 de setembro de 2011

Menos enfermeiros no SNS para agradar à troika... e aos privados!


Para cumprir o dito “memorando de entendimento” com a troika (UE,FMI,BCE) e assinado pelos partidos do poder governativo (PSD,PP,PS) o governo compromete-se a cortar 20% nas horas extraordinárias dos médicos e dos enfermeiros (para os pouco que as fazem), em 2012 e 2013, e os hospitais empresa (EPE) e os centros de saúde estão terminantemente proibidos de contratar novos médicos e enfermeiros, seja a título individual ou através de empresas de prestação de serviços.

Por outro lado, as ARS estão a despedir enfermeiros contratados, embora sejam necessários, como aconteceu recentemente no Algarve, 65% dos jovens profissionais de enfermagem estão desempregados ou são precários – segundo o estudo realizado pela Ordem dos Enfermeiros, "Situação Profissional dos Jovens Enfermeiros em Portugal" –, 20% estão desempregados, o que representa um aumento de 1,3% face ao ano anterior, e 4,9% já estão a trabalhar noutras áreas.

Neste momento a renovação de contratos também encontra-se congelada e só o próprio ministro da Saúde poderá autorizar excepções. Os administradores hospitalares que desrespeitarem a regra serão alvo de sanções e podem mesmo ser despedidos. A proibição de contratação de novos enfermeiros, apesar de muitos hospitais e centros de saúde revelarem uma falta enorme e chocante destes profissionais da saúde – questão que não se manifesta com os médicos na medida em que em relação a estes o problema centra-se mais na racional e justa distribuição segundo as necessidades do SNS – foi publicada em Diário da República.

Esta proibição, plasmada em forma de lei para ninguém ter dúvidas e depois do Fundo Monetário Internacional ter revisto para o dobro os referidos cortes, revela que o governo quer ir mais além das metas que foram impostas pelo dito “acordo” com a troika. E, em vez do corte dos 550 milhões de euros, o governo PSD/PP tem a intenção de chegar aos mil milhões de euros (se o povo português deixar, claro!, os governos de coligação não costumam chegar ao fim), criando assim as condições para a privatização de grande parte dos serviços de saúde, especialmente dos mais lucrativos.

Em recente intervenção pública o conhecido “pai do SNS”, António Arnaut, foi peremptório em denunciar esta intenção encoberta do governo que, escudando-se nas medidas de austeridade impostas pelo memorando da troika, pretende simplesmente a destruição do SNS. E foi ainda mais longe na sua indicação: o povo português deve sublevar-se contra estas medidas de encerramento e privatização de serviços, vindo para a rua protestar. E (acrescentamos nós) ocupar os serviços do SNS impondo a continuação do seu funcionamento e, para tal, devem ter o apoio incondicional e activo dos enfermeiros, médicos e assistentes operacionais.

E aqui e agora os sindicatos têm mais do que palavras a mostrar!

Todos devemos promover e incitar à desobediência civil!

sábado, 3 de setembro de 2011

Todos e todas ao Rossio no dia 10 de Setembro!





Somos professores e somos precários. Alternamos o desemprego com as aulas, nalguns casos durante mais de dez anos. Sabemos como é necessário o nosso trabalho nas escolas e sabemos o muito que falta a cada escola para que todos os alunos possam ser dignamente apoiados. Agora, dizem-nos que já não somos precisos, que estamos dispensados.

No final deste mês inicia-se o maior despedimento da história do ensino. Em nome de uma dívida que não foi criada nem por professores e nem por alunos, querem amputar a escola pública. Haverá menos actividades extra-curriculares, as turmas serão maiores (o governo até já decidiu aumentar o número máximo de alunos por turma de 24 para 26 no 1º ciclo do ensino básico) e assim o combate ao insucesso escolar sairá prejudicado.

Nos últimos anos entraram nos quadros das escolas 1 professor por cada 40 que saíram. Isto fez com que o número de professores precários ascendesse a várias dezenas de milhares, quase todos eles a garantirem funções absolutamente fundamentais em cada escola. Agora, alguém decidiu que essas funções deixaram se der fundamentais. A estratégia foi simples e linear: os sucessivos governos precarizaram parte da classe docente para agora a despedirem. Se a substituição de professores efectivos por professores contratados degradou as condições de ensino (impedindo, por exemplo, o acompanhamento de cada turma pelo mesmo professor durante mais de um ano), o despedimento massivo fá-lo-á ainda mais.

Vivemos num mundo virado de pernas para o ar. Quando é nas alturas difíceis que mais faz sentido apostar na escola pública, o governo faz tudo ao contrário, enfraquecendo-a. Mas nós, professores precários e desempregados, não aceitamos este destino. Revoltamo-nos pelas nossas vidas sempre na corda bamba mas também pela plena consciência de que fazemos toda a falta às escolas, aos alunos, à comunidade.

Assim, apelamos à participação de todos e todas neste protesto. Queremos ajudar a construir um futuro melhor e contamos contigo no dia 10 de Setembro, às 15h, no Rossio , com o teu cartaz e a tua mensagem!


PS: Convocatória feita pelo "Precários Inflexíveis" que nós apoiamos. Como enfermeiros também sofremos do desemprego e da precarização, estamos na mesma barricada. A força dos trabalhadores, que vendem a sua força de trabalho como única fonte de rendimento, está na sua união, que passa, por sua vez, pela solidariedade entre os diversos grupos profissionais – professores e enfermeiros a mesma luta!

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Aumentaram os gastos com os enfermeiros!



Os gastos das Administrações Regionais de Saúde com a contratação de médicos e enfermeiros através de empresas de trabalho temporário aumentaram cinco vezes entre 2009 e 2010, de 3,7 milhões para 20,8 milhões de euros – diz o relatório da Administração Central dos Sistemas de Saúde! Apesar de se ter verificado uma redução na rubrica “Custos com Pessoal” entre 2009 e 2010. Note-se que muitas destas empresas são propriedade de médicos e outro pessoal ligado à saúde e de gente bem relacionada, quando não mesmo filiada, nos dois partidos que nos têm desgovernado.

Esta preocupação com gastos com o pessoal da saúde, bem como com o SNS, levou o ministro da Saúde anunciar medidas que irão cortar nas horas extraordinárias, menos 10%, segundo parece, e com as convenções com privados quanto à realização de exames complementares de diagnóstico e outros serviços que o SNS pode muito bem fazer já que a sua capacidade humana e material está longe de se encontrar esgotada. Esta declaração de intenções (para já não passa mesmo disso) provocou de imediato o alarido de alguns médicos, arvorados em opinion makers e defensores da saúde do Zé Povinho quando lhes interessa. O que já não se compreende lá muito bem é que uma organização sindical dos enfermeiros tenha tido uma reacção semelhante, como se os enfermeiros fossem responsáveis pelo aumento das despesas do SNS ou pelo parasitismo do mesmo pelo sector privado.

Ora, toda agente sabe que quem ganha as horas extraordinárias no SNS são geralmente os médicos, que auferem pelo trabalho que deviam fazer no seu horário normal e não fazem porque ninguém os obriga a isso, e não os enfermeiros. Em muitas instituições de saúde do Estado apenas os médicos fazem horas extraordinárias e mais nenhuma outra classe profissional, e muito menos os enfermeiros. A nós, enfermeiros, as horas feitas a mais são pagas em tempo, havendo inclusivamente proibição expressa por parte das administrações que nos sejam pagas em dinheiro conforme manda a lei. E a favor desta proibição os enfermeiros directores e supervisores são os mais encarniçados defensores do trabalho escravo, apesar da falta de enfermeiros ser já gritante e chocante em muitas instituições e serviços.

Em relação aos médicos o problema das horas extraordinárias, que em muitos casos ultrapassa em muito o vencimento base, seria à partida resolvido se estes fossem obrigados a cumprir horários e a atingir objectivos, nem seria preciso acabar com a acumulação de tachos em sectores público ou no privado por via da imposição do regime de exclusividade – embora o fim da parasitação do SNS pelos técnicos, e não só médicos, que possuem interesses no sector privado se impõe como condição sine qua non para se evitar o desmantelamento do SNS. Não se pondo esta questão sequer com os enfermeiros ou outros técnicos de que o SNS bem carenciado está. E os sindicatos da enfermagem deveriam ter já percebido que as horas extraordinárias não são para a enfermagem a solução para os seus baixos salários.

A solução para este problema passa por uma tabela salarial que corresponda e espelhe a formação e competência dos enfermeiros, que deve correr a par com uma carreira profissional digna; ora nada disto acontece. Se a carreira que os sindicatos e o anterior governo nos impingiram não presta, como poderá a respectiva grelha salarial pagar o trabalho efectivamente realizado pelos enfermeiros? Se os sindicatos (e não distinguimos nenhum em particular, todos são responsáveis) se preocupassem realmente com a classe, primeiro teriam levado a luta até ao fim e, por alguma razão não tivesse resultado, mobilizariam depois os enfermeiros para uma greve de zelo em que horas extraordinárias jamais seriam realizadas, para além de outras formas de adequar a “quantidade de trabalho” ao salário realmente auferido. Por exemplo, em alguns serviços até é possível fazê-lo, reduzindo o trabalho aos serviços mínimos; em outros, recusar fazer tarefas que não sejam específicas da enfermagem, como algumas tarefas de carácter administrativo ou da esfera dos médicos que estes gostam deixar para os escravos.

Mas não, os sindicatos querem que os enfermeiros sejam também como os médicos, especialmente no que existe de mais negativo, assim vai a frustração de muitos que se arvoram em representantes da classe, lembrando alguns superiores hierárquicos (da classe, claro!) que se põem em bicos de pés na dita “boa gestão”do SNS.


Emprego" sazonal é sobretudo temporário e informal


Original em Precários Inflexíveis

Uma reportagem recente no jornal Público confirma, com os poucos dados estatísticos oficiais disponíveis, que o abrandamento do desemprego nos meses de Verão se deve sobretudo ao trabalho temporário e às situações informais. Ou seja, os vínculos mais comuns nestes trabalhos com duração limitada são intermediados por empresas de trabalho temporário (ETT) ou correspondem a uma total ausência de enquadramento legal - e não, como seria admissível prever, os contratos a termo certo.

O artigo refere ainda os jovens como o principal grupo etário que acede aos "trabalhos de Verão" e, sem surpresa, aponta os sectores ligados ao turismo (hotelaria e alojamentos, bem como o comércio em geral) como os que mais procuram trabalhadores de forma sazonal. Mas um outro ponto de interesse é o facto de Vitalino Canas ("provedor" das ETT) e Marcelino Pena Costa (presidente da associação das ETT) entrarem na reportagem para voltarem a defender o trabalho temporário e os interesses das empresas intermediárias, com argumentos que estão cada vez mais gastos e com pouca energia.

Marcelino Pena Costa, presidente da Associação Portuguesa das Empresas do Sector Privado de Emprego, queixa-se de que "há uma tentativa de denegrir o trabalho precário". Vitalino Canas, que pomposamente se considera provedor da Ética Empresarial e do Trabalho Temporário, tenta um tom um pouco mais sóbrio, assumindo que os trabalhadores contratados pelas ETT são vistos como estando "numa situação muito precária”. Este duo tem a lição estudada e empenha-se em criar as condições para manter o filão: Pena Costa contrapõe com o trabalho informal e tenta seduzir-nos dizendo que o trabalho temporário pode ser uma oportunidade "conseguir emprego", numa formulação tão interessante quanto reveladora; Vitalino Canas lá diz que os recibos verdes são uma "situação mais precária" e que o trabalho mediado pelas ETT pode ser uma forma de "ter acesso a vínculos laborais mais estáveis". Patrões e "provedor", com discurso afinado, são embaixadores da precariedade em nome do negócio das ETT - que, recorde-se, confiscam em média metade do salário do trabalhador em troca da desvinculação das empresas que verdadeiramente utilizam o trabalho prestado nestas condições.

Os dados da responsabilidade do Instituto do Emprego e da Formação Profissional apontam ainda para uma tendência consistente nos últimos anos. Além do aumento do trabalho temporário no segundo semestre, a duração dos contratos tem diminuído e é mais curta entre os trabalhadores mais jovens.

Ver notícia do Público na íntegra aqui

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

A visita do ministro e o suicídio do funcionário



Quando o ministro da Saúde visitava o Hospital do Espírito Santo de Évora (HESE), uma funcionária, assistente operacional do mesmo hospital, suicidava-se. O ministro “ponderou a suspensão da visita”, comunicou o gabinete do dito, mas considerou que o programa (da visita) devia prosseguir tal como estava planeado. O PCP criticou "insensibilidade" do ministro por não ter interrompido a visita. O BE, pela voz do seu deputado João Semedo, disse estar "desagradavelmente surpreendido" pelo mesmo facto. O suicídio à hora da visita do ministro não deixa de ser simbólico atendendo às condições de trabalho dos trabalhadores da saúde, nomeadamente desta classe pior remunerada. As “razões familiares” invocadas pela administração do hospital para justificar o suicídio são falaciosas.

Um trabalhador que se suicida por enforcamento no local de trabalho fá-lo por razões que têm a ver com o trabalho, com as condições em que é obrigado a exercer a sua actividade, a remuneração e outras formas pelas quais esse seu trabalho (não) é reconhecido. Quando as razões são única e exclusivamente familiares o trabalhador, nem teria lógica, suicida-se longe do sítio onde trabalha. Neste caso as diversas razões ter-se-ão potenciado, ninguém consegue isolar os problemas profissionais dos pessoais em compartimentos estanques, eles interagem e o stress foi maior do que a capacidade de resistência desta trabalhadora. O que é que o Hospital do Espírito Santo, até para fazer jus ao nome, faz para prevenir ou aliviar o stress dos seus trabalhadores? Nada.

Seja o patrão-estado ou patrão-privado ou o patrão-igreja católica-misericórdias a política em relação aos trabalhadores é sempre a mesma: sobrecarregar os trabalhadores com tarefas, muitas das quais nem sequer são da sua competência – como acontece frequentemente com as assistentes operacionais que, depois da reestruturação das carreiras da Função Pública (Lei nº 12-A/2008 e Lei nº 59/2008), passaram de “auxiliares da acção médica” a "pau-para-toda-a-colher", diga-se de passagem, com a conivência dos sindicatos; e tratá-los como descartáveis.

A saúde física ou mental dos trabalhadores pouco importa às administrações hospitalares e respectivas entidades patronais que, paradoxalmente, tratam do negócio da prestação dos cuidados de saúde aos cidadãos. E é aí que se encontra o cerne da questão, porque para esta gente o que interessa é o lucro; se não cuidam da saúde dos seus trabalhadores de molde a que estejam aptos e em perfeitas condições de saúde para, por sua vez, prestar bons cuidados de saúde, como é que tais instituições de saúde podem oferecer um serviço de saúde de qualidade?

O suicídio por enforcamento desta trabalhadora simboliza bem o que é e ainda vai ser a política deste ministro e deste governo de direita PSD/ PP /CDS. O que aconteceu a esta trabalhadora acontecerá em breve a este governo (falamos em sentido figurado, claro!).

segunda-feira, 25 de julho de 2011

A “reavaliação” do modelo de saúde do senhor Silva (PR) e do PSD


“Preços” – Martirena

Cavaco Silva (Presidente da República eleito por 23% dos portugueses eleitores) defendeu, há algum tempo atrás, a reavaliação do modelo de saúde “tendo em conta a emergência social que o país atravessa” com a entrega de serviços do SNS às misericórdias, instituições que, entre outras e de forma anti-constitucional, têm servido para a igreja católica sacar financiamentos ao Estado. Esta afirmação por si só não teria grande importância já que o PR não possui funções governativas, mas pela consonância que este têm dado às suas intervenções com a política do governo saído das eleições de 5 de Junho e pelas suas responsabilidades, quando primeiro-ministro, pelo desmantelamento do SNS.

Em 1988, saiu a lei de gestão hospitalar (Decreto-Lei n.º 19/88 de 21 de Janeiro, complementado pelo Decreto Regulamentar nº3/88 de 22 de Janeiro) que, copiando o modelo de gestão alemão, ficou famosa por entregar a gestão dos hospitais públicos aos médicos, deixando-os à vontade para sabotar os serviços de saúde, nomeadamente consultas e cirurgias, tendo sido a partir desta data que começaram a surgir as famigeradas listas de espera. Isto foi um expediente para obrigar os doentes a recorrerem aos serviços privados, consultórios e clínicas, onde esses mesmos clínicos acumulavam (e continuam a acumular), já que o tempo de espera no sector público era muitas vezes incompatível com o grau de urgência das patologias e era então ouvir dizer ao clínico funcionário público: “aqui não o posso operar, mas na clínica é já para a semana!”. Era depois ver muitos cidadãos aflitos e endividar-se ou a vender algum terreno para pagar ao médico e à clínica; e não menos frequente quando as coisas corriam mal serem recambiados para o público que arcava então com as despesas. Um verdadeiro tráfico de doentes que ainda perdura. Graças à política do cavaquismo para a Saúde.

Veio o governo PS/Sócrates I com o incontornável Correia de Campos como ministro que deu início de forma aberta e sem peias ao encerramento de serviços públicos de urgência e atendimento permanente em centros de saúde e hospitais distritais assim como serviços de obstetrícia e ginecologia e outras especialidades com o argumento de racionalizar custos e de falta de utentes que justificassem a sua existência, no entanto contradizendo o seu discurso de descentralização e regionalização. Como a política era impopular houve que substituir o ministro e já com a cinzenta e aparentemente sonsa pediatra Ana Jorge deu-se continuidade à mesma política mas com maior discrição. E com esta ministra se tratou também de reduzir custos com o pessoal de saúde, concretamente com os enfermeiros, tendo resultado a aprovação da vergonhosa carreira e miserável grelha salarial.

Com o actual governo PSD/CDS, reforçado com o memorando assinado pelo anterior com a troika, vai-se cortar 550 milhões de euros na Saúde, através de medidas como: a revisão e o aumento das taxas moderadoras do SNS; o corte substancial (dois terços) dos benefícios fiscais para a Saúde; para além da continuação dos baixos salários de enfermeiros e assistentes operacionais (as duas categorias profissionais sem as quais os hospitais deixariam de funcionar passados 24 horas), agravado com o roubo de 50% do subsídio de Natal e a continuação do desconto de 5% dos salários acima dos 1500 euros imposto pelo governo socrático.

Contudo, e analisando melhor e a exemplo do que aconteceu com outros países onde esta “reforma” foi feita, não se irá gastar menos dinheiro com os cuidados de saúde dos portugueses, porque com o predomínio do sector privado a quota dos gastos que cabem a cada português individualmente aumentará, sendo agora das mais elevadas da União Europeia, e com as convenções e parcerias público privadas os custos irão também disparar nem que seja para a obtenção dos sacrossantos lucros (as ditas “mais-valias” já que essa gente nada produz) de toda a gente que medra no sector: bancos (incluindo a pública CGD, veja-se o descalabro do “novo” hospital de Cascais), companhias de seguros, médicos, radiologistas e alguns enfermeiros… e demais sanguessugas da saúde e do dinheiro dos portugueses.

Este governo irá tentar completar o trabalho iniciado pela mesma cor partidária há mais de 20 anos, no entanto e apesar de todas as sondagens para sossegar as almas, a “emergência social” falada pelo senhor Silva levará os portugueses a revoltar-se – e os enfermeiros (mesmo que não queiram agora e inclusivamente contra os sindicatos) estarão nas primeiras linhas. Este governo não durará os 4 anos e o povo português seguirá o povo grego: não pagaremos!