domingo, 30 de janeiro de 2011

Mais uma vez, o governo assalta a bolsa do cidadão



Para começar bem o ano, o governo procedeu ao aumento dos serviços das autoridades de saúde pública (ASP), em alguns casos em mais de 5 mil por cento, exemplo das juntas médicas especiais que atestam incapacidade ou deficiência, vacinas contra a febre amarela (que passou dos 15 cêntimos para os 100 euros!) ou vistorias a estabelecimentos comerciais (de 6 para 400 euros) e… pagamento das taxas moderadoras aos funcionários das instituições do SNS.

Para além do corte ilegal e provocatório dos salários, que pode ir até aos 10%, como todos nós infelizmente sabemos, por já o termos sentido na carteira, o governo, através das administrações das instituições de saúde públicas, está a enviar cartas para os funcionários e outros cidadãos que não pagaram taxas moderadoras (algumas dessas pseudo dívidas remontam a 2005, estando mais que prescritas), contando com a ignorância dos cidadãos e jogando com o receio dos processos judiciais. Nos HUC, por exemplo, são mais de 65 mil contas por pagar, das quais cerca de um décimo dizem respeito a funcionários.

Ora, as pessoas não se devem deixar intimidar, por muitas declarações que presidentes de conselho de administração de algum hospital central possam fazer junto das câmaras de televisão, e por várias razões:

1- muitas destas putativas dívidas já prescreveram há muito;

2- as cartas que são enviadas não valem por notificação porque não o foram em correio registado e com aviso de recepção;

3- os cidadãos funcionários públicos, quando “adquiriram” o serviço ou cuidados prestados pelas instituições do SNS, não foram informados do preço e em muitos casos, como aconteceu nos HUC, foram informados que nada tinham a pagar; assim, há uma clara manifestação de má-fé por parte das administrações hospitalares ao quererem agora proceder à cobrança de uma dívida que o utente desconhecia e, na verdade, nem existia;

4- ninguém se deve deixar intimidar com as cartas enviadas por correio simples e até devem rir-se com a ameaças de procedimento judicial porque seria o maior dos gozos ver, por exemplo, o tribunal de Coimbra atafulhado com mais de 65 mil processos para cobrança de dívidas, na sua maioria de montante diminuto que nem daria para os HUC pagar as despesas do processo; e para não falar das centenas de milhar que devem ser as dos hospitais de Lisboa ou do Porto. Todas estas dívidas ou já estão prescritas ou em vias disso, e deixá-las ir para tribunal, numa hipótese remota de que isso venha a acontecer, é maneira segura de nunca serem pagas.

Deixando de lado as ameaças bacocas de cobrança coerciva dos 50 milhões de taxas moderadoras que não foram pagas (na opinião do governo, note-se!), devemos relembrar o recente relatório da OMS - "Avaliação do desempenho do sistema de saúde Português" elaborado em 2010 por esta organização – que diz que são as famílias mais pobres que têm maiores gastos com a saúde e arriscam, por isso, vir a ter um acesso mais limitado a cuidados. E a OMS vai mais longe e aconselha o governo português a reduzir as barreiras à capacidade de pagamento por estes cuidados, afirmando que "o peso dos custos directos das famílias é demasiado elevado em Portugal", em comparação com outros países.

Citando os dados do INE, o departamento da região europeia da OMS diz que, em média, as famílias mais pobres despendem 12% do seu orçamento (excluindo alimentação) em saúde, contra 7% das famílias mais ricas. Os gastos chegam a atingir os 40% para 8% destas famílias, deixando-as em risco financeiro devido à doença. A OMS critica mesmo que 20 a 23% do sistema de saúde seja suportado pelas pessoas, através de pagamento directo, quando a média europeia é de 17%, e o ideal é ficar abaixo de 15%.

Como se vê o povo português paga demasiado pelos cuidados de saúde, indo já longe os tempos em que o SNS era “tendencialmente gratuito”, segundo o estabelecido pela Constituição da República, porque falar em simplesmente “gratuito” é mera ficção. Razão para qualquer cidadão dizer que, antigamente, quando ia ao hospital para tirar sangue, só sangue lhe tiravam, agora, em todas as ocasiões, espetam-nos a seringa na carteira para nos tirar o pouco dinheiro que temos. Já não chegavam os aumentos dos impostos, IVA e IRS, e aumento dos descontos para segurança social enquanto as comparticipações sociais diminuíram ou foram até totalmente retiradas, como o abono de família.

O dinheiro que o governo e as administrações hospitalares nos querem roubar é indubitavelmente para pagar os desmandos na saúde, do tipo dos 21 milhões de euros que a SUCH deu a só três empresas privadas em assessorias que não serviram para nada, ou dos vencimentos escandalosos e dos carros e ajudas de custos de administradores públicos, ou das ruinosas parcerias público-privadas na saúde que orçam em muitas centenas de milhões de euros. Com certeza que não é devido aos salários, cada vez menores, dos funcionários públicos e dos cuidados prestados a estes cidadãos que o “buraco” da saúde aumentou.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Ano 2011 – ano de “esperanças”


Ao desejar um bom ano 2011 aos sócios, os sindicatos, nomeadamente o SEP, não dão como negativo o ano de 2010, apesar de reconhecerem que o “processo negocial das grelhas salariais ficou aquém das justas propostas”. Só que nem as propostas apresentadas pelos sindicatos são justas, nem a carreira, aprovada à pressa antes das eleições legislativas por sindicatos e governo PS nº1, pode ser considerada justa pela e para a grande maioria dos enfermeiros. O balanço do ano que terminou é claramente negativo, mas há quem tenha por hábito ver vitórias em derrotas: de “vitória em vitória” até… à derrota final!

A via judicial é um caminho que se abre devido às contradições da legislação vigente e à pressa do governo em fazer os trabalhadores pagar a crise das contas públicas e da banca privada, impondo medidas de austeridade, como os cortes salariais sobre os enfermeiros. Então, esta via de luta é legítima e exequível. Mas – atenção! – não se substitui à luta travada na rua e no dia a dia, através da greve, da manifestação e do protesto colectivo ou individual. Até agora, quanto sabemos, nenhum enfermeiro recebeu orientação de algum sindicato para contestar os cortes salariais, à semelhança, por exemplo, dos sindicatos dos professores.

Tudo nos leva a crer que o ano de 2011 ainda vai ser mais negro e por várias razões, pela degradação económica do país, pelas medidas (consequências reais do PEC III e PEC IV já exigido por Bruxelas) que virão sobre os trabalhadores e, na questão concreta dos enfermeiros, das matérias que estão a ser negociadas entre sindicatos e governo; e que irão ser aprovadas ainda este ano e, de certeza, não serão de molde a acautelar os interesses de 90% da enfermagem. Estão em fase adiantada de negociação a Avaliação de Desempenho e a Direcção de Enfermagem.

A primeira, que já estamos a ver pela própria informação sindical, vai ser altamente selectiva e discriminatória, com a inclusão de quotas e colocada inteiramente nas mãos das chefias. A segunda, que os sindicatos se orgulham de terem recuperado na nova carreira, vai ser mais do mesmo: uma “Direcção de Enfermagem” controlada pelas administrações e constituída por aspirantes a capatazes – só entendemos uma Direcção de Enfermagem, autónoma e digna da Enfermagem se todos os seus elementos forem livremente eleitos e destituídos pelos pares.

Temos a certeza que estas duas matérias, atrás referidas e já em estado avançado de negociação (mais um cozinhado!), assim como as que faltam, os ACT (Acordos Colectivos de Trabalho), onde estarão definidos os horários e as formas de pagamento das horas complementares e extraordinárias, serão aprovadas praticamente de cruz se por acaso o governo seja demitido e se venham a realizar novas eleições legislativas a meio do ano, como muita boa gente da política conjectura. E, por estas e por outras, o ano de 2011 vai ser para enfermagem um verdadeiro ano horrível. Claro que para 10% da classe, onde se incluem dirigentes sindicais e grande parte das chefias, 2011 será um bom ano pela simples razão de que esta carreira, com o seu “edifício” completo, será “boa carreira”: o que é bom para uns é mau para outros, daí a opinião positiva do SEP, por exemplo, sobre o ano que terminou.

À falta de melhor, já que os sindicatos estão mudos e quedos, e para que todo/a enfermeiro/a possa enviar a sua reclamação contra o injusto e ilegal corte (redução) salarial deste mês e dos outros meses que se avizinham, deixamos disponibilizado online para o efeito a ligação para o Provedor da Justiça.

PS: parece que algumas instituições do SNS estão a fazer incidir a redução salarial não só sobre o vencimento base mas também sobre as horas complementares e extraordinárias, que obviamente foram realizadas em 2010, o que é uma dupla injustiça e ilegalidade!