quarta-feira, 13 de outubro de 2021

A Saúde dos portugueses e o corte nas “gorduras”

 

Imagem Record TV Europa

O Governo quer, no próximo Orçamento de Estado (2022), dar mais 700 milhões de euros para o SNS e ao mesmo tempo cortar nas “gorduras”, que serão as despesas supérfluas do sector, cerca de 130 milhões. O objectivo será dar a imagem de uma gestão racional e cuidadosa.

Mas também poderemos pensar que é dar com uma mão para tirar com a outra, dando a indicação que não será assim. Se não vejamos: menos 18 milhões com a renegociação do preço dos exames complementares de diagnóstico contratados aos privados; menos 40 milhões com a despesas dos testes sars-cov-2; menos 12 milhões com gestão dos medicamentos e menos alguns milhões com a transição digital e gestão mais eficaz. Tudo, ao cabo e ao resto, questão de poupar no farelo, em vez na farinha.

Por que não investir em laboratórios próprios e deixar de estar dependente dos privados em questão de exames complementares de diagnóstico?

Por que não contratar directamente os trabalhadores, desde médicos a enfermeiros, em vez de o fazer a empresas de trabalho temporário? Seria mais de 150 milhões de poupança?

Por que é que o Estado não compra os medicamentos e os fornece gratuitamente aos doentes do SNS em vez de os comparticipar? Teria ganhos, na medida em que o preço de compra de muitos medicamentos em economia de escala é inferior à comparticipação sobre o preço de venda na farmácia!

Por que não preencher as vagas dos quadros dos diferentes sectores de trabalhadores aliciando-os com a exclusividade que poderia ir de mais 50 a 100% sobre a retribuição base? Trabalhadores dedicados dão mais rendimento e produtividade e a prazo haverá sempre ganhos!

Por que não desbloquear de vez as progressões nas carreiras, mesmo ainda antes das suas actualizações em diálogo com os sindicatos? Não esquecer que o Governo PS foi quem mais recorreu à requisição civil sobre os enfermeiros e outros trabalhadores, e não espere por isso reconhecimento!

Por que não acabar de vez com a promiscuidade entre o sector público e o privado da Saúde?

Ou iremos continuar a ver o privado a parasitar o público através de mais este Orçamento de Estado em que o aumento das verbas para o SNS será apenas para continuar, e fomentar até,  a compra de serviços àquele sector que sem os dinheiros públicos teria pouca possibilidade de sobreviver, para mais, num país cuja população possui globalmente um reduzido poder de compra?

Os sindicatos dos enfermeiros marcaram greve para a primeira semana de Novembro e os dos médicos para o final do mesmo mês, será para questionar: a intenção será mesmo para ver satisfeitas as sentidas e mais que justas reivindicações daquelas classes ou será somente para massacrar o Governo em tempo de discussão e aprovação do Orçamento? Depois da aprovação do OE-2022, tudo ficará na mesma e os sindicatos, depois de cumprida a função de “agitprop” tradicional, se remeterão ao silêncio?

É quase diária a vinda a público de casos de hospitais do estado a rebentar pelas costuras, Setúbal, Leiria, Vila Franca de Xira, etc., dando a sensação de que abriu a época à caça dos podres do SNS, e com a incontornável Ordem do Médicos a liderar o processo de denúncia.

Será para perguntar: a Ordem está com medo de perder o seu poder corporativo de influência com a nova legislação que está a ser discutida, e já aprovada na generalidade no Parlamento, e que irá regular as associações profissionais?

Não deixa de ser curioso ver uma Ordem dos Médicos a denunciar constantemente a falta de médicos como uma das principias razões pelo estado calamitoso do SNS e, ao mesmo tempo, ouvir o seu bastonário a opor-se veemente à formação de mais médicos com a alegação de uma possível menor qualidade da sua formação, escondendo que a verdadeira razão é que isso iria simplesmente aumentar a concorrência entre a classe médica!

É o próprio bastonário que dá o mau exemplo de acumular as funções no SNS com as do privado! Assim como a Ordem dos Médicos não teve prurido em receber cerca de 430 milhões de euros da indústria farmacêutica em ano de vacinação em massa, quando no ano passado recebera apenas 6 mil euros! Factos que por si só dizem bem sobre o que faz mover toda esta gente.

Sabemos, e só não sabe quem não quer, que o Governo, seja do PS ou de qualquer outro partido, apenas põe em prática as orientações vindas de Bruxelas, e estas têm sido, desde o início da adesão de Portugal à União Europeia, a de destruição do SNS; assim como de todo o sector público, para engordar o sector privado, seja ele nacional ou estrangeiro.

O Orçamento de Estado de 2022 será, à semelhança dos anteriores, o orçamento para a engorda dos porcos que continuam a chafurdar na gamela dos dinheiros públicos. O resto é conversa para entreter o pagode. Entretanto o povo sofre.

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