O
Governo decretou, através de directiva da Direcção Geral de Saúde
(DGS), que os trabalhadores da saúde que tenham estado em contacto
com doentes infectados por coronavirus não entrarão em quarentena
se não apresentarem sintomas. Toda a gente sabe que muitos
infectados são assintomáticos e que os sintomas da infecção por
este vírus se confundem com os de gripe vulgar. É notícia também
que os dias perdidos pelos trabalhadores da saúde devido a
quarentena serão descontados nas férias e nas horas extras. São
abusos que o governo e as administrações hospitalares estão a
cometer aproveitando-se da pandemia pelo covid-19, exteriorizando o
que lhes esteve sempre na alma: os trabalhadores do estado,
nomeadamente os da saúde, sejam eles, enfermeiros, médicos,
assistentes operacionais ou outros, são números, são carne para
canhão, descartáveis a todo o momento. Esta atitude do governo é
uma reles provocação que merece todo o repúdio por parte de todos
os trabalhadores e ficamos à espera da reacção dos sindicatos; a
Ordem dos Médicos foi a primeira a reagir e já pediu a revogação
da directiva da DGS.
Estes
abusos do Governo PS e dos seus comissários políticos nas
administrações hospitalares traduzem-se também na extensão do
período de trabalho das 8 para as 12 horas, sempre com o pretexto de
se fazer frente ao coronavírus, e no desprezo pelos trabalhadores
que apresentam história de doenças do foro respiratório ou com
idade superior a 60 anos. Por exemplo, no CHUC, foi pedido aos
trabalhadores com passado de doença respiratória, asma, pneumonia,
etc., que preenchessem um imprenso no serviço de Medicina do
Trabalho para possível mudança para linha de rectaguarda e não
ficarem assim em contacto directo com doentes infectados. Ora, isto
ocorreu há cerca de duas semanas e ainda nenhum trabalhador foi
contactado até agora. O que consta é que haverá enfermeiras já
infectadas a trabalhar no pólo do Hospital dos Covões; assunto que
os sindicatos, a começar pelo SEP se ainda não entrou em
quarentena, poderão investigar a fim de tomar a atitude mais
correcta. Se se confirmar o rumor, então, é, mais uma vez, o
desprezo completo pelos trabalhadores, o que sempre foi a marca das
administrações que têm passado pelo CHUC e pelos HUC, diga-se em
abono da verdade, sempre prontos a não pagar aos trabalhadores as
horas extras praticadas e dificultar as progressões na carreira.
Há
neste momento 165 enfermeiros, médicos e assistentes operacionais
infectados, ou seja, 8 por cento do total, e será número a pecar
por defeito, já que a DGS acaba de rectificar os números. O
Governo, decididamente, não quer gastar dinheiro e acha que 1500
testes por dia chegam, enquanto na Alemanha os 160 mil por semana são
considerados insuficientes e a OMS não se cansa de dizer que está
na ordem do dia fazer testes, testes e testes. E vem agora o
primeiro-ministro gabar-se da compra de equipamento médico à China,
facto com um atraso de dois meses pelo menos, e que vai haver mais
capacidade para a realização de testes rápidos, até 4000 por dia
– é preciso ter lata, já que há enfermeiros que estiveram em
contacto com infectados, completamente desprotegidos, continuam ao
serviço sem terem realizado qualquer teste! Há hospitais com falta
clamorosa de equipamento de protecção individual, batas, máscaras,
luvas e viseira em particular, e há enfermeiros chefes a pedir aos
trabalhadores que tragam material de casa, a começar pelos panos
para limpar o chão. É o descalabro e o desprezo pelos
trabalhadores!
Nunca
será perda de tempo interrogar-nos sobre as razões da falta
generalizada de meios para combater a pandemia, ou seja, o que é
feito do SNS?
Durante
mais de 30 anos, mais precisamente a partir da famigerada Lei de
Gestão Hospitalar (1988), primeiro governo de maioria absoluta de
Cavaco Silva, que se começou a destruir o Serviço Nacional de Saúde
de forma paulatinamente; umas vezes, mais depressa quando com os
governos do PSD e CDS/PP e, outras vezes, mais devagar e
disfarçadamente com o PS no poder da governação. O resultado é do
conhecimento geral: um serviço público de saúde descapitalizado, e
subfinanciado mesmo depois da saída formal da troika (Portugal gasta
cerca de 6% do PIB enquanto a Alemanha despende perto de 10%), com
falta de camas, de medicamentos, de reagentes para análises, de
material diverso, de médicos, enfermeiros, auxiliares, técnicos e
administrativos, e com instalações degradadas. Ou seja, falta tudo,
porque se andou a financiar os grupos económicos da saúde privada,
alguns dos quais estrangeiros, e os bancos. Para estes houve dezenas
de milhares de milhões de euros e... (não devemos esquecer) para
pagar uma dívida pública, grande parte dela ilegítima e até
ilegal, e que será bem maior depois de passada esta crise, assim
como os sacrifícios que irão ser pedidos (impostos) aos
trabalhadores portugueses.
Os
técnicos que trabalham no SNS, sejam os que assistem directamente o
doente, ou os outros, encontram-se já, e ainda antes do surgimento
da pandemia, cansados e desmotivados, por falta de reconhecimento do
seu trabalho e de serem mal pagos e sem perspectiva de futuro por
inexistência de carreiras dignas e motivadoras. Quando alguns deles
decidiram encetar greves, para ver satisfeitas as suas mais que
justas reivindicações, como aconteceu com os enfermeiros, foram
miseravelmente atacados pelo governo do senhor Costa, foram
vilipendiados, acusados de “assassinos” e outros mimos do género,
não só pelo governo e pelos órgãos de informação ao seu serviço
e de toda a sorte de fazedores de opinião, mas, infelizmente, por
muitos daqueles que agora à janela lhes batem palmas, numa
manifestação de indecorosa hipocrisia. Muita gente só se lembra
dos enfermeiros quando vê a coisa mal parada, mas é o que temos no
país do oportunismo.
Parece
que muita gente ainda não percebeu, mas o tempo rapidamente lhe irá
abrir os olhos, que o governo do PS pouco se importa com a saúde dos
portugueses, especialmente a saúde dos mais pobres, dos mais idosos,
dos imigrantes e dos sem-abrigos, isto é, de todos aqueles que se
encontram no fim da escala social. O que mais importa ao PS e ao
Costa é o estado da economia, dos lucros dos acionistas das grandes
empresas, dos bancos em particular, a começar por aquelas que agora
irão enriquecer ainda mais à custa da crise (os bancos irão
receber dinheiro do BCE com spread negativo de 0,75% e irão
emprestar a spreads até 1,5%). Daí o se ter demorado tanto
tempo a tomar as medidas necessárias e mesmo agora são frouxas,
como acontece com o controlo nas fronteiras ou uso de meios de
protecção individual, mas foi-se lesto na declaração do estado de
emergência para reforçar o medo, já difundido pelos media e
pelas intervenções inadequadas dos próprios governantes, entre o
povo português. E pior que a pandemia do vírus, é a pandemia do
pânico!
Depois
da crise falsamente atribuída ao coronavírus, mas que é de um
sistema económico que só visa o lucro e não considera a pessoa
humana, iremos ver um SNS completamente destroçado e os privados já
integrados no tal “Serviço” Nacional de Saúde de que tanto
gostam, com mais desemprego, com menos idosos, porque muitos deles
terão morrido, como resultado de uma política malthusiana aplicada
conscientemente, porque também ninguém se admire que o governo do
PS venha a seguir a regra já admitida pelo governo do PSOE de dar
prioridade aos doentes com maior “valor social” quando o sistema
colapsar; ou seja, quando se tiver de optar entre um idoso pobre e um
rico ou um político, o critério médico será mandado às malvas e
o primeiro é que será sempre o preterido. E não faltará muito
para as camas das unidades de cuidados intensivos ficarem
completamente esgotadas, não nos esqueçamos que enquanto a Alemanha
possui 28 mil camas para cuidados intensivos e 25 mil ventiladores, e
vai adquirir mais 10 mil, para uma população que é oito vezes
superior à portuguesa, Portugal possui cerca de 800 camas e perto de
1200 ventiladores, cujos números exactos o próprio governo
desconhece, avançando com números incertos, como tem acontecido com
o número de pessoas ou de profissionais de saúde infectados.
Os
números dos infectados e das mortes por coronavírus quase de
certeza que não estarão certos, vários indícios apontam nesse
sentido: já se sabia, há cerca de três semanas, de estarem
internados diversos doentes infectados no CHUC, por exemplo, com o
serviço de infecciosas quase cheio, sem que nenhum desses números
entrasse nas contas da senhora ministra, a tal que foi demitida de
Presidente da Administração Central do
Sistema de Saúde (ACSS) por falsificar o número de doentes
nas listas de espera. Solidariedade será a última coisa a esperar
de um governo que só vê cifrões à frente, lamentando que já não
haja superavit orçamental e tenha de fazer um orçamento
rectificativo; ou dos outros países da União Europeia, nomeadamente
do país mais rico, a Alemanha; ou de um Estados Unidos, considerado
o baluarte da democracia; a ajuda, e contra o que se esperava, está
a vir de países que têm estado sujeitos a sanções económicas por
parte da UE, da pequena Cuba, da Rússia e da China. É possível que
a ajuda não seja desinteressada, mas está a acontecer e é nos
momentos difíceis é que se vê onde estão os amigos; e mais: são
estes países, embora capitalistas de estado, com direcção estatal
e centralizada da economia, que estão a ter um melhor controlo sobre
a pandemia.
Quando
acabar a pandemia, Portugal estará com certeza pior, nem saberemos
se o SNS irá sobreviver, mas para que nada disto aconteça, os
profissionais de saúde bem como o povo português deverão tomar
quanto antes uma atitude.
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