Foi cerimonial a rega da oliveira, plantada no parque municipal de Coimbra há 3 anos, para comemorar a existência do Serviço Nacional de Saúde; cujo diploma (devemos relembrar!) foi aprovado com os votos contra do CDS e do PPD, onde se incluía o então deputado Presidente Marcelo. Parece que esta rega se realiza em 16 concelhos do país. Será humor negro ou, no mínimo, patético, sabendo-se o que está a acontecer e quem são os responsáveis.
No dia que o SNS faz o seu 43º aniversário, as
notícias sobre o seu futuro não são nada animadoras. Ficamos a saber que houve
menos 15 mil partos nas maternidades públicas só na última década; e que a Comissão
de Acompanhamento de Resposta em Urgência de Ginecologia, Obstetrícia e Bloco
de Parto, pela boca do coordenador Diogo Ayres de Campos, alvitrou a possibilidade
de junção de alguns daqueles serviços.
A diminuição do número de partos, num período
tão alargado e depois de muitas das maternidades terem sido fechados nos
governos de Sócrates e de Passos Coelho, como justificativa para o encerramento
de mais serviços, ao mesmo tempo que se abre ainda mais mercado para os
privados, não pode ser considerada senão como uma manobra patética de
privatização/liquidação do SNS.
Perante tão tosca razão, devermos, todos, fazer
algumas perguntas:
Esta comissão, mais uma entre outras
semelhantes, não terá sido criada para dar uma base de argumentação para a política
do governo que assim pode continuar a liquidar o SNS, agora de natureza puramente
“técnica”, e aligeirar de si a responsabilidade da política destrutiva dos
serviços públicos de saúde em Portugal?
Os responsáveis desta comissão, a começar pelo
coordenador médico, também eles acumulam funções simultaneamente no público e
no privado, sabendo toda a gente que foram os médicos, alguns deles, que
sabotaram o trabalho no público para traficarem os doentes entre os dois sectores?
Não terão os médicos e alguns enfermeiros que,
sob a batuta das ordens e a colaboração dos sindicatos e administradores hospitalares,
não terão boicotado os serviços de urgência ginecologia e obstetrícia e os
blocos de parto em alguns hospitais públicos, especialmente, em locais onde já
proliferam os serviços privados naquelas áreas?
Esperam-se respostas!
O certo é que enquanto alguns dos coveiros do
SNS vão regando, física e mediaticamente, a oliveira (e o fundador do SNS dando
mais voltas na tumba) ficou-se também a conhecer, ou a confirmar-se, que a “Falta
de médicos e especialidades no interior obriga utentes a procurar serviços no
litoral e no privado”. O negócio há muito que começou e há que alimentá-lo.
Para além das ditas “alterações climáticas”,
que terão trazido alguns dias de mau tempo, as nuvens vão também ensombrando a Saúde
em Portugal. São o Estatuto do SNS, a nomeação do seu CEO e as palavras
agoirentas de Marcelo, que considera que o «diploma do SNS está "no bom
caminho"». A duplicação da estrutura de direcção do SNS vai de certeza
isentar de responsabilidades o recém-empossado ministro da Saúde (e do Governo),
quadro sénior do aparelho socialista, porque a gestão será igualmente “técnica”.
E assim, de forma asséptica, se vai dando cabo do SNS.
Os coveiros do SNS
Se o SNS tem coveiros facilmente
identificáveis, no entanto, tem outros que mais disfarçadamente o vão
enterrando apesar de encherem a boca de tiradas e lamentos aparentemente a seu
favor. Pura hipocrisia. Se as ordens de médicos e de enfermeiros há muito que
são claras quanto ao que vêm, há outros que lá vão disfarçando, como a Federação
dos Médicos que “teme que o SNS acabe independentemente do nome do ministro”. Deveremos
colocar a questão: o que têm feito estes médicos quanto ao combate das listas
de espera de consultas e de cirurgias?
Aparentemente ninguém deverá saber, nem os
próprios, apesar da maioria correr de hospital público para a clínica ou
consultório privado em trapezista manobra de ubiquidade.
Não se espere melhor saúde em Portugal, espere-se
apenas melhores negócios com as clínicas privadas a proliferarem nas
proximidades dos hospitais públicos. Coimbra é um bom exemplo deste vento
favorável para o negócio, com mais novas clínicas privadas e com a expansão
repentina de clínicas mais antigas. É paradigmático o caso da Sanfil, situada inicialmente
em plena baixa e à beira rio, rapidamente passou de um a quatro edifícios, para
além de outros espalhados pela alta da cidade e bem próximos do CHUC. Já possui
centros em mais nove cidades; de âmbito de empresa quase familiar passou a
grande grupo económico de nível nacional. E graças ao negócio das listas de
espera. Melhor do que este, nem o negócio da droga!
Para além da degradação constante e acelerada
do SNS é a igual degradação das condições de vida de um grande número de cidadãos
portugueses. Portugal tem maior agravamento da pobreza em 2021, passando a oitavo
pior da União Europeia. São mais de 2 milhões de pobres, que irão aumentar em
número, com a certeza de ficarem ainda em situação pior em curto período de
tempo, já que nem salários nem pensões irão acompanhar o aumento galopante da
inflação. Mais pobreza leva a menos saúde, pior saúde leva inevitavelmente a um
empobrecimento sem fim.
Ao menos ficamos a saber quem são os responsáveis e algum dia se fará a devida correcção.
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