Jorge Torgal, António Ferreira e mais 19 médicos e farmacêuticos assinam este artigo, pedindo uma gestão diferente, mais racional e que outras vozes sejam ouvidas.
Destaque: “Não é razoável que se combata a atual situação — já não pandémica, mas endémica — recorrendo a medidas “sanitárias”. É tempo de reconquistarmos o direito a viver.”
No mesmo período, a taxa de doentes em estado grave ou
muito grave — doentes admitidos em cuidados intensivos sobre o número de casos
ativos — foi de 0,35%.
De acordo com os últimos dados divulgados, a “incidência”
de infeção entre os que completaram o plano de vacinação é de 0,01%.
Face a este quadro, é nosso entendimento que não se
justificam medidas extraordinárias de confinamento e supressão da atividade
social e económica. As correntes de opinião que defendem essa atuação fundamentam
o seu apelo em três motivos: 1. a evolução crescente da incidência de testes
positivos; 2. a aclamada letalidade da “variante indiana”, por atingir os mais
jovens e saudáveis, sem compreenderem que, à medida que a cobertura vacinal
imuniza os mais idosos, o vírus, felizmente, só pode circular entre os mais
jovens; 3. e, por último, o risco falacioso de colapso do sistema de saúde.
Nenhum destes argumentos tem sustentação: o primeiro,
porque o tantas vezes proclamado aumento da incidência reflete o aumento de
incidência de infeção — e do número de testes positivos — e não a verdadeira
incidência da doença. Quantos mais testes forem realizados, e devem
realizar-se, maior será o número de casos positivos; o segundo, pelas razões já
apontadas; e o terceiro, porque em nenhum período da pandemia se verificou, em
Portugal, um colapso do sistema de saúde – e essa situação, perante os números
atuais, também não ocorrerá nem no presente nem no futuro previsível.
De facto, a média das taxas de ocupação das camas hospitalares
do SNS foi, em 2020, em pleno período pandémico, sempre inferior à de 2019 (7%
inferior). Nos seis maiores hospitais portugueses esta diferença foi de 10%. Do
mesmo modo, a pressão sobre os serviços de urgência foi menor em 2020 (em pleno
período pandémico) do que em 2019 (o número de episódios de urgência foi 28%
inferior). Além disto, a taxa de ocupação das unidades de cuidados intensivos
em 2020 (neste caso, as existências diárias sobre o número de camas
disponíveis) foi, também, mais baixa do que em 2019 (77,3%, em média, em 2019,
contra 61,6%, em média, em 2020). Isto porque, apesar do aumento de admissões
em unidades de cuidados intensivos no final de 2020, foi possível incrementar
significativamente o número de camas disponíveis.
Defendemos naturalmente que a resposta à pandemia seja
prioritária e que não pode de forma alguma deixar de ser uma preocupação em
Portugal, tal como em todo o Mundo. Contudo, estamos numa fase endémica e
apenas o desconhecimento sobre o que se passa realmente no terreno pode levar a
adiar novamente a necessidade de instalar um sistema de monitorização em tempo
real, informatizado e centralizado, das camas hospitalares, fator que, durante
o último ano, levou a que se procedesse a um encerramento da prestação de cuidados
de saúde a doentes não covid-19, o qual está a ter, e continuará a ter no
futuro, consequências desastrosas em termos de morbilidade e mortalidade (neste
último caso, afetando, também gravemente, as idades pediátricas). E este é um
aspeto determinante a ter em conta na denominada “matriz de risco”. Porque o
risco de morrer por uma doença que não a covid-19 está, esse sim, a aumentar em
Portugal. Além disso, a vacinação não pode ser ignorada como uma arma eficaz e
protetora da transmissão e da doença grave.
A humanidade passará a conviver, em situação endémica,
com este novo vírus, tal como convive com muitos outros. Haverá, sempre, a
possibilidade de ocorrerem surtos.
É possível delinear uma estratégia que, evitando a
utilização das erradas medidas de confinamento geral, seja eficiente:
- aceleração da vacinação, simplificando o processo
(excessivamente consumidor de recursos humanos, que fazem falta nos centros de
saúde para o normal atendimento dos doentes), envolvendo-se agentes da
sociedade civil no processo (como, por exemplo, as farmácias), de modo a
aumentar rapidamente a cobertura vacinal;
- aperfeiçoamento da vigilância epidemiológica, a qual
tem sido um insucesso em Portugal;
- cessação de medidas avulsas de fim de semana e outras
do mesmo tipo, que já demonstraram não ter impacto no número de novos casos.
Por todas as razões apontadas acima, não é razoável que
se combata a atual situação — já não pandémica, mas endémica — recorrendo a
medidas “sanitárias”, cuja eficácia tem sido colocada em causa por vários
investigadores de grande prestígio. É importante recordar que estas medidas
produzem efeitos mais gravosos para a sociedade e o bem comum do que a própria
doença; além de que algumas destas medidas podem ter contribuído para o
incremento da circulação do vírus e não o contrário.
Os signatários apelam às autoridades de saúde e aos
agentes da governação para que, antes de tomarem decisões com enorme potencial
deletério, ponderem as opiniões cientificamente fundamentadas dos cientistas e
profissionais de saúde que, não negando a importância da covid-19, propõem
estratégias para a sua abordagem diferentes das que têm sido seguidas. É tempo
de reconquistarmos o direito a viver.”
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