terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

Os "aumentos salariais" para os trabalhadores do Estado


in "DN"
Os sindicatos têm andado em negociações com o governo para aumentos salariais; a proposta apresentada pelos primeiros é de aumento de 90 euros igual para todos os trabalhadores da função pública, que por sua vez levaria a aumento generalizado dos salários do sector privado; o governo de início foi numa de 0,3% para todos, depois 7 euros e, por fim e aparentando num grande esforço de magnanimidade, de 10 euros mas só para os trabalhadores do estado que aufiram até 683 euros. Claro que, por este ritmo, jamais os trabalhadores da da função pública regressarão aos salários de 2010, não contando com a inflação, e nem os restantes trabalhadores. É uma desvalorização permanente dos rendimentos do trabalho, que o governo PS tenta escamotear. O resto é conversa da treta para iludir os incautos.
Como seria de esperar, os sindicatos fazem o papel deles, indignam-se com a proposta do governo, consideraram-na “inaceitável e provocatória”, o que não deixa de ser verdade, tendo em virtude disso realizado manifestação e greve no passado dia 31 de Janeiro; e como o governo não descola da sua posição, como tem sido habitual, e em relação a outras matérias, como férias e subsídio de alimentação, não mostrou abertura para melhoria, os sindicatos das duas centrais ameaçam avançar com “novas formas de luta”. Ora, o que acontece é que esta é mais uma cena já vista, um déjà vu nauseante, seja, por um lado, um governo irredutível, porque sabe que do outro lado da mesa se encontram sindicatos dóceis, que por detrás dos bastidores garantem a paz social; todos interlocutores que pouco ou nada enganam. Mas, pelo sim pelo não, o governo entendeu arranjar mais uma ministra, a da Modernização do Estado, pessoa aparentemente mais trauliteira para arrumar de vez com a tal reforma, tão desejada pela nossa burguesia, que porá a máquina do Estado a trabalhar com menos gente e com menores custos e, não deixa de ser importante, a fazer menos concorrência com os privados nos serviços ainda públicos.
O jornal “Expresso”, o porta-voz oficioso do militante nº1 do PSD/PPD, fez contas e chegou à conclusão que o poder de compra dos trabalhadores da Administração Pública sofreu uma diminuição de 10% desde a intervenção da troika em Portugal e que a subida anunciada pelo Governo do senhor Costa está “muito longe” de compensar a perda acumulada. Ora, deve-se dizer que os números estão errados e que a perda de poder de compra, contando com a desvalorização imposta pela inflação, será mais do dobro, ou seja, mais de 20% em média. Este sofisma, por não passar de uma falácia feita de má-fé, serve para enganar os trabalhadores e impedindo-os assim de reivindicar aumentos justos e que mais não são que um direito, embora sempre atacado, que lhes é inerente.
Mas nem os 10 por cento, em média, os sindicatos reclamam, e até os 850 euros de salário mínimos são relegados para segundo plano e a actualização das reformas, a começar pelas mais baixas, é completamente esquecida. Salário mínimo de 900 euros, tal como em Espanha (e não nos esqueçamos que a “nossa economia”, falando no geral, é cada vez mais um prolongamento da espanhola), como aumento geral 20% em média para os salários de todos os sectores, bem como aumento das reformas mais baixas para os 600 euros, são reivindicações que não pecam por excesso, apenas reporiam a situação dos rendimentos dos trabalhadores e dos aposentados e reformadas para níveis anteriores a 2010. Claro que estas propostas não concitam a concordância do governo e nem dos patrões, porque iria contra a missão a natureza do governo e do PS e impediria o normal fluir da acumulação e concentração do capital. E perante a timidez das propostas sindicais e da cobardia política dos seus dirigentes, o governo PS/Costa continua a fazer voz grossa.
Não só os salários na Função Pública estão, em termos reais, a baixar como a precariedade está a aumentar. E é o Instituto Nacional de Estatística (INE) que o diz: no ano da chegada da troika (2011) existiam 817,6 mil trabalhadores com vínculos laborais instáveis e no ano passado, 2019, o número de trabalhadores com este tipo de vínculo laboral atingiu quase os 900 mil; ou seja, uma diferença de mais de 73 mil trabalhadores. Enquanto os trabalhadores se deparam com salários mais miseráveis e situação laboral mais precária, a banca lucra quase 5,3 milhões de euros por dia (!) em 2019, isto é, os quatro maiores bancos (dois deles inteiramente espanhóis) apresentam lucros de 1,9 mil milhões de euros: Santander Totta, lucros de 527,3 milhões (mais 5,5% em relação a 2018); BPI, lucro de 328 milhões, quebra de 33% face a 2018, contudo a actividade em Portugal gerou um resultado de 231 milhões de euros, subida de 13 milhões de euros; BCP, lucros de 302 milhões, mais 6,9%; CGD, um lucro de 776 milhões de euros, mais 280 milhões de euros face a 2018, o melhor resultado em 12 anos; deve-se salientar que estes lucros foram feitos graças ao aumento das comissões sobre os clientes, a maior parte deles simples cidadãos. O povo paga sempre.
Perante a pilhagem e a extorsão, o governo, na pessoa de um dos seus ministros mais paspalhos, vem manifestar indignação pelos prémios que os administradores privados e principais quadros da TAP irão receber em ano de prejuízos, mais de 100 milhões de euros (prejuízo de 105,6 milhões de euros). É preciso ter lata para o desaforo e para a farsa. É público que o Estado possui 50% do grupo TAP (Atlantic Gateway, de David Neeleman e Humberto Pedrosa, 45%, e os trabalhadores 5%), mas são os privados que gerem e embolsam os lucros, agora os prémios, ficando o Estado com o prejuízo. Claro que assim qualquer um (vigarista) é um empresário de sucesso! Para alterar a situação de atribuição dos prémios, o estado teria que adquirir, pelos estatutos por si aprovados, note-se!, a parte que cabe aos privados. Mas, depois do episódio do bobo Pedro Nuno Santos, David Neeleman, que salvou a sua empresa falida à custa da TAP, anuncia a possível venda da sua participação, os 45%, à alemã Lufthansa. A transportadora dita “nacional” passará a ser uma filial da gigante alemã, confirmando a posição de protectorado de Portugal no seio da UE, e o Governo PS/Costa um mero gestor dos negócios dos capitalistas. Como se constata os factos falam por mil palavras. É por estas e por outras que “não há dinheiro” para os trabalhadores!

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