António
Garcia Pereira
«Antes
de entrar na abordagem deste tema da actualidade, devo fazer uma
dupla declaração de interesses:
Por um
lado, aceitei, com outros Colegas do Escritório, sermos mandatários
do Sindepor – Sindicato Democrático dos Enfermeiros Portugueses
nos procedimentos legais relativos à impugnação da requisição
civil decretada na passada quinta-feira 6/2, que consideramos
ilegítima e ilegal.
Por
outro, sou absolutamente avesso a campanhas de manipulação e de
engano da opinião pública, bem como a manobras ou operações
negras de homicídio de carácter, visando simplesmente a
descredibilização pública de alguém de que se não goste ou que
se nos oponha.
Dito
isto, convirá referir que é hoje bastante difícil discutir a
chamada “greve cirúrgica” dos enfermeiros, porquanto a campanha
maciça de intoxicação levada a cabo pelo Governo e pelos seus
“homens de mão” (agências de comunicação, think
tankers,
comentadores e fazedores de opinião) tem – jogando com o natural
descontentamento dos doentes do Serviço Nacional de Saúde e dos
seus familiares e também com os seus mais que legítimos sentimentos
de dor, de revolta e de angústia – feito generalizar a convicção
de que, sendo o direito à vida e o direito à saúde direitos
fundamentais, esta é uma greve que estava e está a pôr em causa
tais direitos, e ainda por cima unicamente por egoístas e fúteis
interesses materiais e remuneratórios.
Ora,
a primeira questão que há que colocar é que esta greve, tal como
foi convocada e levada a cabo, nãodeixou
os cidadãos necessitados de cuidados de saúde, emergentes ou
urgentes, privados desses mesmos cuidados. E que, exactamente por
isso mesmo, o Governo não consegue apontar e identificar um
só caso concreto em
que tal tenha acontecido por virtude – ou seja, como consequência
directa e necessária – da greve dos enfermeiros ou do não
cumprimento dos serviços mínimos decretados.
Aliás,
convém também e desde já notar que é verdade que o Governo tem
vindo – para impressionar a opinião pública e até para
pressionar o juiz que irá julgar a acção judicial – a anunciar
diariamente pretensos números oficiais de milhares de intervenções
cirúrgicas (não referindo, aliás, se urgentes ou não) que teriam
sido adiadas devido à greve.
Mas o
mesmo Governo recusa-se significativamente a esclarecer se essas
cirurgias são as que estavam marcadas há um ou dois meses, ou se
antes são aquelas (inúmeras) que foram agora, já durante a greve e
os serviços mínimos, remarcadas propositadamente para além dos
normais programas cirúrgicos e da capacidade de resposta dos
Serviços, e que assim já se sabia perfeitamente não poderem ser
realizadas. Como não divulga os números comparativos das cirurgias
marcadas, das efectivamente realizadas e das adiadas no mesmo período
do ano passado (quando não havia greve), impedindo desta forma que
se comprove ainda mais facilmente aquilo que se tem estado a passar
nalguns Centros Hospitalares, e que é uma manipulação miserável.
Manipulação
esta consistente em, nomeadamente, num Hospital onde normalmente e
com os recursos humanos habitualmente disponíveis, funcionavam, por
exemplo, 4 salas de blocos operatórios e os serviços mínimos foram
fixados em 2 dessas salas, a Administração tratar de mandar abrir 8
ou 11 salas e marcar para todas elas intervenções não urgentes nem
emergentes que já sabe que não será possível realizar, mas,
nalguns casos até se chamando os doentes ao Hospital para depois se
lhes dizer: “afinal não vão ser intervencionados devido à greve
dos enfermeiros”! Como também sucedeu estarem os enfermeiros
disponíveis para trabalhar em intervenções cirúrgicas e estas não
serem marcadas para a parte da tarde (como sucede há duas décadas
às sextas-feiras, por exemplo, no Hospital de Viseu e voltou a
suceder na passada sexta-feira 8/2).
E
chegou-se mesmo ao cúmulo de se informarem pacientes de que a sua
operação não iria ser realizada “devido à greve dos
enfermeiros” em Centros Hospitalares onde pura e simplesmente não
houve, nem há, greve dos enfermeiros,
como Leiria e Amadora/Sintra.
Estamos,
pois, perante uma gigantesca, frenética e inqualificável campanha
de manipulação da opinião pública, enganando propositadamente as
pessoas com falsidades prévia e propositadamente preparadas e
montadas.
Desta
forma, ninguém fala nas verdadeiras causas do desastre a que tem
sido, pelos sucessivos governos, conduzido o Serviço Nacional de
Saúde.
(...)
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