Recentemente, a OCDE indicou que Portugal foi dos países em que a “pandemia mais afectou o acesso aos cuidados primários”, os dados constam no relatório "Health at Glance" da OCDE. Ou terá sido o encerramento deste sector de cuidados de saúde com o propósito mais de empurrar os utentes para o sector privado? O mesmo relatório destaca Portugal como o país com maior cobertura vacinal contra a covid-19.
Duas razões que deveriam levar o governo a
reforçar em pessoal e outros recursos os centros de saúde e as USF, em
particular, para atendimento de todas as patologias. Mas não, a ministra ainda
há pouco referiu que muito possivelmente o atendimento não covid poderá ser
prejudicado, atendendo ao elevado número de “casos”, que prevê que atinjam o
número record de 37 mil casos de “infecção” na primeira semana de Janeiro.
Ou antes, haverá já casos de outras doenças
que não estão a ser atendido devido à dificuldade de acesso aos cuidados
primários que continuam em verdadeiro lock-out, com chamadas telefónicas por
atender, mas quando lá nos deslocamos não se vê número de utentes que justifique
tal situação. É mais o alarmismo mediático em tom capcioso.
O mesmo acontece com as urgências hospitalares,
com as notícias mais que alarmistas de “Falta de resposta do SNS24 e dos
centros de saúde pressiona urgências dos hospitais”. Levando a que alguns médicos, e mais
concretamente a Ordem dos ditos, a afirmar que “Vai ser preciso mudar de
estratégia”.
Se, por exemplo, em Março de 2020, o número de
consultas presenciais diminuiu 66% face ao mesmo mês de 2019, e apesar do
aumento das consultas à distância, online ou telefónicas, também se registaram-se
mais 20 mil mortes por excesso, ou seja, 2024,9 mortes por milhão de
habitantes, acima da média dos países da OCDE, no mesmo período.
E o engraçado, sem grande piada, é que para
além da diminuição dos cuidados primários presenciais, também as idas às
urgências diminuíram, nomeadamente a admissão de doentes com enfarte agudo do
miocárdio e AVC. E é para continuar com esta política que o noticiário das “urgências
a rebentar pelas costuras” se repete este ano. Com o facto curioso de que o
vírus está mais benévolo (a dita “variante” ómicron), porque já se adaptou ao
hospedeiro e este ao dito num abraço evolutivo de um mesmo biota.
Mas, no outro lado da realidade, os enfermeiros,
assim como os restantes trabalhadores do SNS, realizaram mais 5 milhões de
horas extraordinárias, num total de 18,5 milhões, nos primeiros nove meses do
ano de 2021, segundo dados da ACSS.
E as horas extraordinárias e prestações de
serviço já custaram mais de 400 milhões de euros ao SNS, dinheiro que poderia
ter sido investido na contratação efectiva de mais trabalhadores. No entanto, o
governo e a ministra entenderam por bem sacrificar os trabalhadores, e em
particular os enfermeiros, e simultaneamente engordar os privados.
Face a esta política de desprezo do governo em
relação aos enfermeiros e aos cidadãos utentes do SNS, é inteiramente correcto
que aqueles profissionais tomem algumas medidas em sua defesa, embora ainda
muito parcelares e inconsequentes: mais de 3 mil enfermeiros, segundo a Ordem,
apresentaram escusa de responsabilidade.
E as manifestações de desagrado vão surgindo: “Os
enfermeiros do serviço de cirurgia geral de homens do Hospital de Vila Nova de
Gaia apresentaram recusa de responsabilidades no cuidado dos doentes. Os
profissionais denunciam falta de condições estruturais do serviço e um número
insuficiente de recursos humanos”.
Ou “Os enfermeiros do Hospital Garcia de Orta,
em Almada, denunciaram hoje a situação de “exaustão e desmotivação” em que se
encontram, face ao aumento do volume de trabalho e ao “não pagamento de 20 mil
horas de trabalho extraordinário”.
No entanto, é notícia. “Médicos de família
alertam para "caos absoluto" nos centros de saúde”, “OMS alerta para
grande número de hospitalizações com variante Ómicron” e “Portugal bate recorde
de infeções. Ministra avisa que ainda vão subir”. Mas se passarmos pelas USF ou
pelas urgências hospitalares (Hospital dos Covões e HUC), como fizemos, à
semelhança do que acontecera em relação às UCI do HUC no ano passado, podemos
verificar que ou estão quase vazias, com poucos utentes e alguns na rua à chuva
porque os seguranças não os deixam entrar (?), no caso das duas primeiras, ou
com a lotação ainda longe de esgotar, no caso das UCI no ano passado.
A intenção na prática do governo do PS e do
senhor Costa, embora contrariando o discurso, é a de disfarçada e paulatinamente
ir degradando o SNS, engordando os interesses privados (não será por acaso que
o secretário Lacerda nem disfarça o seu papel de agente directo) e, pelo outro,
lançar no desânimo e na exaustão a
grande maioria dos enfermeiros e restantes profissionais do SNS.
Catarina Martins diz que “SNS só melhora se PS
não tiver maioria absoluta”, talvez a pensar no acesso ao pote, é que nós dizemos
que para salvar o SNS, nem PS e nem PSD!
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