sábado, 29 de março de 2014

A nossa doença é um luxo



Carla Romualdo

Se há coisa que me desperta curiosidade é saber se aqueles que acham que o país está melhor passaram recentemente por algum hospital público. Ando, há pelo menos duas décadas, a acompanhar a doença crónica de quem me é muito próximo. São pelo menos 20 anos de consultas, exames, operações cirúrgicas e internamentos num hospital público. E durante este período nunca vi uma degradação tão evidente da qualidade do serviço prestado por esse hospital em concreto, um dos maiores do país, como a que se vive hoje.

Muitos dos médicos mais experientes e qualificados, entre eles muitos chefes de serviço, debandaram para o privado (depois de reformados da função pública e de terem acumulado com o privado - Nota). E não foram só os cortes nas remunerações a pesar na decisão, foi também a atitude de desprezo e de falta de consideração por parte de quem manda, a não valorização de qualquer esforço para prestar um melhor serviço público. Ficaram médicos jovens, acredito que muito qualificados, mas inexperientes, numa área em que a tarimba faz toda a diferença. No recibo de vencimento de um destes médicos não se espantem se virem um salário líquido de pouco mais de mil euros por um horário de 40 horas semanais (o dos enfermeiros não chega a tanto apesar da carência enorme destes profissionais que são obrigados a emigrar devido ao desemprego - Nota).

A experiência das pessoas que conheço é a de que os tempos de espera por consultas e exames aumentaram. Os exames que requerem anestesia continuam a ser um problema. Na sala de espera ouvi, há dias, uma conversa entre médico e paciente elucidativa a este respeito. Se o doente quisesse anestesia para realizar certo exame, esperaria à volta de três meses, sem anestesia poderia fazê-lo no dia seguinte. O doente hesitou mas acabou por abdicar da anestesia.

Nunca tinha ouvido, como há dias, uma enfermeira dizer a um paciente internado: “Infelizmente o hospital não tem todos os medicamentos que os doentes tomam em casa”. Tampouco tinha ouvido uma auxiliar confirmar a escassez de cobertores para todas as camas. As enfermarias precisam de obras urgentes – as paredes estão esburacadas, as janelas não fecham bem, há aquecimento no Inverno mas no Verão faz um calor insuportável, em muitos dos corredores a luz não é ligada até ser absolutamente indispensável, há enfermarias com cinco e seis camas onde não deveriam estar mais do que três. Numa enfermaria com cinco camas, pode estar disponível um único cadeirão, aquilo que permite que um doente possa passar algum tempo fora da cama, com o mínimo de conforto.

Em situações limite, de lotação completa, pode acontecer, como já assisti, que, não havendo espaço para transferir um doente terminal, ele agonize numa enfermaria repleta, com o rodopio inevitável de familiares que vêm despedir-se, com angustiantes cenas de choro e desmaios num espaço exíguo, tendo como testemunhas involuntárias todos os outros pacientes e famílias. Não é ficção, garanto-vos.

As urgências, ao contrário do que garante o governo, estão muitas vezes acima da sua capacidade de atendimento. Já por aqui contei o que respondeu um médico a quem se perguntava quando atenderia um doente nas urgências. Com 60 pacientes à espera, respondeu que não era um super-homem.

O encerramento de unidades de saúde gera situações de injustiça e crueldades intoleráveis e vai privando cada vez mais portugueses do seu direito constitucional de acesso a cuidados de saúde.

E o ministro da Saúde veio hoje afirmar que os portugueses tomam medicamentos a mais, sem adiantar uma explicação mais detalhada, sem esclarecer a que tipo de situações corresponde essa prescrição, sendo certo que para muitos doentes crónicos a alternativa a um elevado número de medicamentos diários é a morte.

A troika impõe cortes na saúde, já sabemos, os hospitais devem gastar menos, e o país já não se pode dar ao luxo de suportar um Serviço Nacional de Saúde que, pecado capital, não dá lucro. Entretanto, a banca multiplica a oferta de seguros de saúde, os hospitais privados aguçam os dentes, desdobram-se em exames complementares de diagnóstico, descobrem necessidades de intervenção cirúrgica onde ela nem seria recomendável. No próximo mês, com a apresentação do Documento de Estratégia Orçamental, ficaremos a saber de quanto será o corte na Saúde para 2015, sendo certo que a incógnita é mesmo essa, de quanto e não se haverá corte.

E a saúde, que, a par com a educação, deveria ser um dos pilares de uma sociedade democrática, promotora do cumprimento dos direitos humanos e da efectiva igualdade de direitos e oportunidades, vai-se tornando um luxo acessível a um conjunto cada vez mais restrito, enquanto o discurso governativo procura justificar o injustificável com meia dúzia de termos de marketing – acabar com o despesismo, racionalizar, cumprir as metas do défice. Já não se trata de um risco iminente, está a acontecer. O SNS está a ser desmantelado debaixo dos nossos olhos e as vítimas somos nós, os nossos avós, pais, filhos, até aqueles que ainda não nasceram.

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quinta-feira, 27 de março de 2014

Galiza mobilízase en defensa da sanidade pública, gratuíta e universal



Miles de galegos e galegas saíron á rúa, atendendo á chamada da Plataforma Sindical da Saúde, conformada por CIG, CCOO, UGT, C-SIF, CESM e OMEGA, nas cidades e vilas do país para defender a sanidade pública, denunciar as políticas privatizadoras do Partido Popular e exixir que se preserve a gratuidade e o carácter público e universal do noso sistema sanitario.

Cun total de 11 manifestacións e 2 concentracións, persoal sanitario e miles de usuarias e usuarios percorreron as principais rúas das cidades e vilas galegas en todas as áreas sanitarias para denunciar o desmantelamento da sanidade pública e exixir outras políticas que preserven o seu carácter gratuíto e universal.

Estas mobilizacións son, para María Xosé Abuín, secretaria nacional de CIG-Saúde, “a demostración do malestar que hai entre a cidadanía por mor das políticas do “Partido Popular” e constatan que as galegas e galegos “non imos consentir que se venda a sanidade pública para beneficio das súas empresas amigas, deixando a unha grande maioría da poboación sen máis prestacións que as básicas a medida que se poñan en marcha os procesos de privatización”.

Abuín alertou de que coas políticas de recorte e de privatización as empresas da sanidade privada atenderán aquelas patoloxías que máis beneficios lles garantan e derivarán á sanidade pública as máis custosas provocando maior demora na súa prestación”.

Isto terá como consecuencia, segundo a secretaria nacional de CIG-Saúde, unha prestación sanitaria de calidade para quen poida pagala e unha sanidade de beneficencia para quen non teña os recursos necesarios, que son a maioría das galegas e galegos.

Manifesto

Ao remate das mobilizacións deuse lectura a un manifesto no que se denuncia que coa chegada de Feijóo á Xunta, o Partido Popular iniciou unha campaña de recortes, desmantelamento e privatizacións da Sanidade Pública, pretendendo que a sanidade “sexa un privilexio, accesible a quen o poida costear a través dos repagos que tratan de impor. Ou acudindo á sanidade privada, adiantando os cartos que despois o SERGAS reintregará”.

Subliñaron que a sanidade é unha necesidade e un dereito e que “ante a enfermidade, precisamos duns servizos sanitarios que nos axuden a mellorar, a sobrelevar a debilidade que nos produce, a sandar”. Para garantir isto demandaron uns servizos sanitarios que atendan a todos e todas “por igual, sen discriminacións nin desigualdades”, o que entenden que só se garante cunha sanidade pública.

(...)

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segunda-feira, 24 de março de 2014

10 Kms a pé para levar filha deficiente ao médico



Esta é a história de uma mãe que percorre 10 quilómetros a pé, em plena Estrada Nacional 3, a empurrar a cadeira de rodas da filha deficiente para a levar ao médico.

O caso passa-se em Vaqueiros, no concelho de Santarém, onde a extensão de saúde foi encerrada em Setembro de 2013.

Quando precisa de levar a filha a uma simples consulta ou ir buscar as receitas dos medicamentos, Ofélia Marques vê-se muitas vezes obrigada a percorrer a pé os cinco quilómetros que a separam de Pernes, a vila onde encontra o Centro de Saúde e a farmácia mais próxima.

"Não tenho outra hipótese, porque não tenho transporte para a menina. Às vezes, ainda me oferecem boleia, mas a cadeira dela depois não cabe nos carros", disse Ofélia Marques à Rede Regional.

Para regressar a casa, caminha de volta os cinco quilómetros a empurrar a cadeira de Patrícia, de 32 anos, que sofre de paralisia cerebral desde bebé, na movimentada estrada que liga Torres Novas a Santarém, e onde o perigo de atropelamento espreita a cada curva.

Vaqueiros é servida apenas por um autocarro diário às 7h30 da manhã, a carrinha da Junta de Freguesia não está adaptada, os taxistas já evitam fazer este serviço e nem sempre a ambulância dos bombeiros voluntários de Pernes está disponível.

Meter pernas ao caminho é a opção que resta a esta mulher de 52 anos, que não pode deixar a filha sozinha em casa.

Problema é "simples de resolver"

A Junta da recém-criada União de Freguesias de Casével e Vaqueiros aponta o dedo ao Agrupamento de Centro de Saúde (ACES) da Lezíria na incapacidade para resolver o problema, que até tem uma solução relativamente simples.

Aquando da reorganização territorial, o ACES aceitou colocar um médico na freguesia durante mais um dia por semana, mas exige que seja na extensão de saúde de Casével.

A Junta defende que a unidade de Vaqueiros tem todas as condições para ter consultas uma vez por semana e até disponibiliza a funcionária administrativa e o equipamento informático.

"Não conseguimos compreender a posição dos responsáveis do ACES", disse à Rede Regional Joel Oliveira, o tesoureiro da Junta, explicando que este organismo tem mantido sempre uma posição de absoluta intransigência em não reabrir uma vez por semana a unidade de saúde familiar da aldeia.

"Colocar aqui um médico um dia por semana é praticamente a mesma coisa que mandá-lo a Vaqueiros, e toda esta população, que é maioritariamente idosa e não tem condições para se deslocar, teria acesso aos cuidados de saúde a que tem direito", acrescentou Joel Oliveira, sublinhando que "a Junta não vai baixar os braços".

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quarta-feira, 12 de março de 2014

Saúde infanto-juvenil em processo de recessão «desolador»



Colectivo FLAN
«Esse desolador processo da recessão em saúde infanto-juvenil já se vê bem no dia-a-dia dos profissionais de saúde, mas demora um pouco até chegar aos documentos e às estatísticas».

A especialista em psicoterapia cognitivo-comportamental Margarida Gaspar de Matos considera que Portugal assiste a um «desolador» processo de recessão em saúde infanto-juvenil, embora reconheça que esta informação «demora um pouco até chegar aos documentos e às estatísticas».

A propósito da conferência que irá realizar no dia 20, no Centro de Investigação do Centro Hospitalar de Lisboa Central (CHLC), sobre «Prioridades para a investigação pediátrica na Europa», Margarida Gaspar de Matos lembrou que «a saúde da criança e do adolescente melhorou muito nos últimos anos em Portugal».

Estes elementos estarão disponíveis no relatório do projecto RICHE, que visa identificar as lacunas na investigação europeia da saúde infantil e o qual é coordenado em Portugal por Margarida Gaspar de Matos.

«Até à data do fim deste projecto os resultados da recessão ainda não se sentiam muito nos documentos e nos números publicados», disse.

No entanto, a especialista sublinha que «esse desolador processo da recessão em saúde infanto-juvenil já se vê bem no dia-a-dia dos profissionais de saúde, mas demora um pouco até chegar aos documentos e às estatísticas».

Para Margarida Gaspar de Matos, «a precariedade tem influência na saúde de todos, por várias vias: pela dificuldade de acesso aos cuidados de saúde, pelo aumento das deficiências na sua prestação, mas sobretudo porque as pessoas - muitíssimo preocupadas com a sua sobrevivência em aspectos básicos do dia-a-dia - tendem a relegar a sua saúde e a dos seus para um plano menos saliente».

«Por isso se fala de saúde nos países desenvolvidos e saúde nos países em desenvolvimento, e nós estamos em recessão», sublinhou.

Também Álvaro de Carvalho, coordenador nacional para a saúde mental, disse à Lusa que tem recebido informações de profissionais que trabalham nas urgências pediátricas e nos serviços de pedopsiquiatria que apontam para «um aumento dos casos extremos».

Trata-se de «crises emocionais» detectadas em crianças e jovens e que «evidenciam maus tratos físicos e emocionais», com a crise a estar na origem destas situações, disse.

Nos adultos, a crise reflecte-se na não comparência nas consultas e tratamentos, muitas vezes por falta de dinheiro para os transportes até às unidades de saúde, bem como o medo de ausência no trabalho.

O psiquiatra lembrou que em momentos de crise como a que Portugal atravessa, as respostas devem passar pelo reforço dos muitos médicos de proximidade, incluindo na área da psiquiatria, dos apoios sociais e a promoção de programas activos para o mercado de trabalho.

Recentemente, o presidente da Comissão da Saúde da Mulher, Criança e Adolescente alertou para o aumento de casos de angústia e depressão infantil, devido às dificuldades das famílias, e disse que Portugal se arrisca a ser um «país de crianças tristes».

Em declarações à Lusa, Bilhota Xavier disse que as carências das famílias demonstram-se de várias maneiras e reflectem-se nas crianças desde muito cedo.

«Ficamos perplexos com as faixas etárias das crianças em que se detectam os cada vez mais frequentes problemas de ansiedade, angústias e depressões, algumas com oito, nove, dez anos», disse o pediatra.

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