quinta-feira, 28 de novembro de 2013

40 horas na função pública salvaguardam “interesses públicos relevantes”



Os juízes do Tribunal Constitucional compreenderam a "intensidade do sacrifício" para os trabalhadores, mas consideraram que "a medida de aumento do período normal de trabalho dos trabalhadores em funções públicas visa a salvaguarda de interesses públicos relevantes". Os sindicatos e os partidos da oposição, que levaram a questão para o TC, pensavam (e parece que ainda pensam) que o TC seria o baluarte último e indestrutível na defesa dos interesses dos trabalhadores, têm agora o resultado à vista. É o resultado da sua demissão de instituições que têm por missão, pelo menos em teoria, a defesa dos interesses do povo mas que na prática nada fizeram para merecer essa confiança.

Não víamos grande fundamento – em termos jurídicos, diga-se – para que o TC considerasse inconstitucional o alargamento do horário de trabalho na Função Pública, atendendo para mais aos argumentos avançados pelo governo, a contenção salarial e a redução dos custos com trabalho extraordinário em tempo excepcional de crise, o alargamento dos horários de funcionamento e atendimento ao público dos serviços da administração, com “efeito positivo” para a sociedade. Um desses efeitos positivos ficou já bem visível, a imediata suspensão da contratação de 111 funcionários pela Unidade Local de Saúde de Bragança, que seriam para substituir, em parte, os trabalhadores que se aposentaram. Terá sido uma poupança de 1 milhão e 800 mil euros, ou seja, salvaguardou-se um “interesse público” de indiscutível “grande relevo”.

Quase de certeza que a medida que visa o corte de 10% no montante das reformas para a dita “convergência” do sistema público com o privado irá ser chumbada pelo TC. Porque foi uma decisão (o envio da lei) tomada por um reformado (não um qualquer reformado!) e os juízes do TC não quererão ver uma das mordomias diminuída, não será demais relembrar que a presidente da Assembleia da República se aposentou com 500 contos (ainda não havia o euro), com a “provecta” idade de 42 anos. Claro que o horário das 40 horas não é para todos os funcionários públicos, os juízes, entre outros sectores mais ligados ao exercício do poder, estão isentos. Os sindicatos da enfermagem também desejavam (e ainda deverão desejar) uma excepção para a classe, as 40 horas deverão ser apenas para a “plebe”.

Claro que o governo jogou com a divisão no seio dos funcionários públicos, assim como tem jogado com a divisão entre os trabalhadores do estado e os do sector privado, e os sindicatos têm infelizmente entrado no jogo, e não apenas os dos enfermeiros. Alguns sindicatos da função pública chegaram a apresentar providências cautelares, aceites pelos tribunais, e que agora irão todas por água abaixo, na mesma linha que levou a questão para o TC, lançando assim, e mais uma vez, a ilusão de que a via judicial se iria substituir à via política. Ora, a questão do alargamento do horário dos trabalhadores da função pública é acima de tudo uma questão política. Uma questão a ser tratada pelos sindicatos e pelos partidos no campo da luta política. E não pelos tribunais que são, ao cabo e ao resto, um dos órgãos de poder do estado, ou seja, do patrão, que é uma das partes em confronto.

A decisão do TC mostra a natureza deste órgão do poder da classe dominante, cujos elementos são nomeados pelos dois partidos do arco da governação, e mostra mais, que o caminho apontado pelos sindicatos e partidos da oposição é um caminho sem saída.

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