quarta-feira, 16 de junho de 2010

O Governo comprou a paz social


Quando a Fenprof assinou o acordo, no dia 9 de Abril, com o Governo/ministra da Cultura, esta não escondeu o seu regozijo porque representava “um passo muito importante para a tranquilidade nas escolas”, para além de constituir “uma solução equilibrada para os professores…”, solução que nada resolveu de fundamental, daí o descontentamento e a luta dos professores continuarem. No entanto, a tão almejada (pelo Governo) tranquilidade (leia-se: paz social) foi restabelecida.

Com este acordo com os sindicatos dos enfermeiros (que não é acordo, segundo as palavras do coordenador do SEP, porque não foi assinado pelo dito e pelo SERAM, ambos formando a CNESE), o Governo compra, mais uma vez a paz social num sector do estado problemático e sensível, que é a Saúde. Pena que é que estes sindicatos, afectos à CGTP/Intersindical e ao PCP, a vendam tão barato. E é só nesta, e não em outra perspectiva, se pode compreender a desconvocação de uma greve de mais de uma semana (nunca uma greve tão prolongada tinha sido convocada nestes governos do PS/Sócrates!), ficando-se apenas por uma greve de 1 (um) dia, para se poder realizar a dita manifestação. Está mais do que visto, e até pela maneira como foi desconvocada, a prestações (facto também inédito no sindicalismo português!), que esta greve não era para se fazer.

Devemos recordar que, quando o PS ganhou as eleições em 2005, logo o PCP (e o BE) se congratularam publicamente porque tinha sido um partido de “esquerda” que tinha ganho e que a “direita” tinha sido derrotada; mas o tempo veio demonstrar, infelizmente, que o PS a governar é pior que a direita mais empedernida. Devemos lembrar mais uma vez – parece que não é demais – que, quando a actual ministra foi reconduzida no cargo, o SEP congratulou-se em público pelo facto, já que dava garantia de “continuidade do processo”; razão pela qual os sindicatos tinham assinado, ainda antes das eleições legislativas de Setembro, a Carreira de Enfermagem. E é aqui que o acordo está feito, não vale a pena o SEP dizer o contrário, porque o resto são pormenores. Este foi o grande erro.

Estas considerações, refrescantes da memória, vêm a propósito para desmistificar a questão de “em vez de se atacar o Governo, atacam-se os sindicatos”. Foram os sindicatos que vieram dizer que esta ministra era a melhor interlocutora para as negociações com os enfermeiros. Como em tudo, no fim é que se deve fazer o balanço, aferindo pelos factos, e estes mostram que tanto o PS, como a ministra Ana Jorge, são inimigos do povo português e, em particular, dos enfermeiros. Os factos mostram que quem concilia com os nossos inimigos não pode ser nosso amigo, mesmo que não faça isso de forma deliberada; mas o que conta são os resultados e não as intenções, porque de boas intenções está o inferno cheio.

Assim se compreende facilmente que os sindicatos de enfermagem, e em particular o SEP (dirigentes), porque é o maior e se diz de esquerda, não esteve na barricada certa e a sua estratégia esteve errada desde o início, nem que seja pelo simples facto de que considerou amigo quem era visceralmente inimigo dos enfermeiros. E quanto à estratégia, é fácil de ver que esteve, e está, errada, e não há pior cego do que aquele que não quer ver.

Quando começaram a sair os primeiros enfermeiros licenciados das escolas, havendo já algumas centenas deles pela força dos CESE’s, o problema da grelha salarial deveria ter sido logo resolvido, as outras questões poderiam vir depois, mas como o problema não afectava os senhores dirigentes sindicais, que nem o complemento possuíam, deixaram correr o tempo. A altura até era boa, não havia crise nem desculpas do défice excessivo das contas públicas. Mas não houve visão das coisas nem vontade política, outros valores se levantavam.

Quando este governo de “esquerda” PS/Sócrates congelou as carreiras da Função Pública, não se assistiu a nenhum “levantamento popular” dos trabalhadores do Estado, fomentado e liderado pelos sindicatos do sector da CGTP, maioritários, nem sequer a uma simples Greve Geral Nacional, também estendida ao sector privado, condição sine qua non para a eficácia da luta dos trabalhadores do Estado. E muito menos se assistiu à revolta dos sindicatos da enfermagem. E, quando as carreiras foram descongeladas, não se vislumbrou nenhum esforço por parte dos “nossos” sindicatos” para a subida de escalão na velha carreira, bem pelo contrário, foi o silêncio e a cumplicidade, próprios de chico-espertos, com o objectivo de “vamos ceder aqui” para depois sermos compensados na “nova” carreira. Só que a ministra (a tal parceira “amiga”) e o Governo foram mais espertos e acabamos por não subir (valorização salarial mais que justa já que estamos há 8 anos na mesma) nem na velha nem na nova carreira.

Em Janeiro passado, os enfermeiros fizeram uma greve e uma manifestação que surpreenderam os próprios dirigentes sindicais, jamais se tinha feito alguma coisa parecida depois de 1976. Logo as direcções sindicais trataram de convocar uma outra greve, e outra coisa não poderiam fazer perante a irredutibilidade do governo, mas já com menos dias e em vez de uma manifestação ficaram-se por uma “concentração de jovens enfermeiros” frente ao ministério da Saúde: andou-se para trás. Agora, os dirigentes sindicais encheram o peito de ar, e para não serem acusados de conivência com o Governo, marcaram uma greve salteada de cerca de 2 semanas (espremidas davam 8 dias) e uma manifestação nacional, mas mal a ministra ameaçou com o “encerramento” das negociações, partindo do princípio que terá havido alguma vez diálogo a dois, os nossos destemidos dirigentes e representantes, apressadamente e respirando de alívio, desconvocaram a greve, e a prestações, para não levantar suspeitas.

Ao suspender a greve, a CNESE coloca-se, a ela própria, em posição de fraqueza, mostrando que o desejo principal é mais frequentar o gabinete ministerial do que resolver os problemas da classe de enfermagem. Esta greve era para ser levada até ao fim, mas o SEP entendeu o contrário, justificando-se com uma argumentação falaciosa. Dizer que era “uma perda de dias de vencimento” e o “governo encerrava as negociações” ainda mais cedo, então não se compreende que se tenha feito greves, nomeadamente em Janeiro e em Março, e se faça agora 1 dia greve, porque será tudo uma inutilidade – na opinião do SEP, note-se! Para expressar o protesto dos enfermeiros, não será necessário fazer uma manifestação, basta mais uma concentração à frente do ministério ou uma conferência de imprensa.

Mas nós sabemos por que é que a greve foi suspensa e por que é que as greves deste ano foram feitas, simplesmente por duas ordens de razões:

Uma, a CGTP e os seus sindicatos querem que este governo do PS/Sócrates se mantenha o mais tempo possível e que o PSD não vá tão depressa para o poder governativo. Porque toda a gente sabe que a demissão deste governo é tudo uma questão de tempo: ou será demitido por Cavaco Silva, ainda antes das próximas eleições de Fevereiro, ou logo depois caso seja este a ganhar. E enquanto o PS (des)governa, a paz social deverá manter-se a fim de se poder salvar a "economia nacional".

A outra ordem de razões é a de que, embora não pareça, o essencial das questões relacionadas com a nova carreira já está aprovado: uma carreira discriminatória, em que só cerca de 20%, ou nem isso, de enfermeiros é que atingirá o topo da carreira; os chefes e supervisores que não queiram ir para enfermeiro principal terão a valorização garantida, com aumentos de 200 e 300 euros respectivamente, mais do que os enfermeiros em início de carreira (os sindicatos da CGTP sempre defenderam o alargamento do leque salarial), e será uma questão de tempo ver TODOS os actuais dirigentes e delegados sindicais a ficar bem classificados nos concursos para enfermeiro principal e chegarem dentro de pouco tempo ao topo da carreira – esta carreira foi feita à medida dos burocratas sindicais, muitos deles no último escalão de graduados ou chefes.

E uma outra razão se pode ainda apontar, enquadrando-se nesta última ordem: continuar com greves, não se sabendo bem onde e como acabariam, corria-se o forte risco dos actuais sindicatos e direcções sindicais perderem o controlo do processo reivindicativo: outros sindicatos poderão nascer, outros movimentos se constituirão e lá se irá por água abaixo o protagonismo e o tacho sindical de muitos enfermeiros que preferem antes o conforto do sofá dos gabinetes e o prazer dos passeios sindicais ao trabalho rotineiro de enfermaria, já esquecido por muitos deles.

Assim se compreende como o Governo comprou a paz social e os sindicatos a tenham vendido (bem como os interesses da classe) por um preço tão baixo!

6 comentários:

Anónimo disse...

Muito bem escrito e devidamente fundamentado! Estes sindicalistas são pura tralha!!!

Anónimo disse...

Este SEP tem cá uma lata!!! Como é possível ainda virem se armar em cordeirinhos mansos!!! A aclamarem que são inocentes!!! Foram as vossas trapalhadas ao logo destes anos que nos colocaram onde nós estamos agora!!! Além de que esta "suposta" negociação foi mal conduzida desde o inicio... tanto foi que está á vista de qualquer um o resultado da porcaria que eles fizeram!!!
Ainda á tempos numa destas ultimas reuniões promovidas pelo SEP para definição de formas de luta o Sr. José Carlos teve a coragem de tratar mal todos nós que escrevemos neste e noutros blogs, afirmando em plena auditório dos HUC "existe uma verdadeira esquizofrenia a decorrer nesses blogs, onde pessoas escrevem coisas que não são reais". Além de certamente não saber o que é um doente que sofre desta patologia, também deveria de saber que quem anda a inventar histórias fantásticas é ele, quem anda a ver coisas é ele e toda a sua comandita... Eles não são esquizofrénicos, SÃO NO MÍNIMO MENTIROSOS!!!
Na minha opinião eles andaram a fazer reuniões por todo o pais e conseguiram ver na realidade a revolta que pairava na classe, sendo que uma greve neste momento poderia se tornar incontrolável, poderia colocar em risco até a manutenção dos cuidados mínimos, e o SNS. Dai que com a desculpa de continuar as negociações anularam a greve. Mas que raio, fizessem a reunião com o ministério só após a greve, assim toda a população ficaria a saber o nosso descontentamento.
EU VOU ME DESSINDICALIZAR!!! e só espero que o Zé Carlos e toda a sua comandita tenham vergonha e se demitam!!! Ou será que já tem medo de voltar ao hospital vergar a costas???

desiludido disse...

Muito bem dito!!!
Um texto com todos os pontos nos "i"!!!

É uma tristeza o rumo que isto levou...
Eu já não era do SEP, mas a minha esposa vai deixar de o ser com toda a certeza!!! Sacanas!!

parabéns Moves

Classe contra Classe ! disse...

As direcções sindicais dos sindicatos dos enfermeiros e dos professores, reaçiocinam ao contrário da lógica da luta de classes.
Se o governo procura impôr um acordo,mas que no qual as direcções sindicais discordam e não o assinam,porque razão se desconvoca a luta,quando a classe está mobilizada para a fazer,e quando se sabe que é apenas esta,que pode derrotar as intenções do governo?

"classecontraclasse.blogspot.com"
Classe contra Classe!

Anónimo disse...

Quantos mais abandonarem o sindicato e não lutem antes para distituir estas direcções,mais estes oportunistas cantam de galo e a classe sairá prejudicada.

Anónimo disse...

grande parte da enfermagem não tem consciência de classe e nem sabe o que isso é!só se importam com o facto de serem licenciados e nem lutaram por uma nova carreira e o resultado aí está! ainda bem que escolhi outra carreira porque desta já estava farto ........
o move nada tem a ver com o mup, nem de longe, infelizmente!