terça-feira, 2 de março de 2010

A estratégia do empata


O Governo/ministra da Saúde veio, na reunião de26 de Fevereiro, empatar mais uma vez, agora com a argumentação de que a Lei nº 12-A de 2008 tem de ser respeitada em tudo o que diga respeito à carreira/grelha salarial da Enfermagem e, perante esta posição ministerial do empata, os sindicatos, concretamente os da CNESE foram para casa arranjar refutação aos argumentos que lhes foram apresentados e provar que a referida lei não é uma “lei de valor reforçado”, ou seja, “qualquer acto legislativo (decreto-lei, por exemplo) posterior não está, constitucionalmente, obrigado a dela não se desviar”.

Eis o cerne da questão! Eis a razão por que a negociação sobre a grelha salarial e outras questões que se prendem directamente com a carreira não andam nem desandam! Afinal, foi preciso tanto tempo para se chegar à questão essencial! Por que é que a ministra não falou nesta questão logo na primeira reunião? Chegou-se a uma situação verdadeiramente patética, de cuja responsabilidade os sindicatos não se podem eximir. Estamos de acordo com um colega que num blog sugere que, na reunião do próximo dia 16, os nossos queridos representantes sindicais levem o chazinho e uns bolinhos e confraternizem.

Não sabemos bem se devemos chorar ou rir, já que esta representação trágico-cómico está a assumir proporções elevadas. Os sindicatos continuam a deixarem-se levar por argumentação falaciosa. As leis fazem e desfazem-se da mesma maneira, e respeitam-se ou furam-se consoante os interesses. A tal Lei nº12-A/2008 vale o que vale, se não valeu para os professores e muito menos valerá para os médicos, também não vale para os enfermeiros. E, mais importante, se a Lei foi aprovada e está a ser aplicada na prática foi porque os trabalhadores deixaram, tendo confiado essa luta aos sindicatos. Deve-se lembrar que os sindicatos dos trabalhadores da Administração Pública não quiseram, não souberam e não persistiram na luta contra esta e outras leis que o PS fez contra os que trabalham. Deve-se apontar o exemplo dos trabalhadores e dos jovens franceses, aqui há alguns atrás, que fizeram manifestações quase diárias contra uma famigerada Lei, denominada Contrato do Primeiro Emprego (CPE), que consistia em criar mão-de-obra quase gratuita para os patrões, até que o CPE foi revogado pelo Parlamento. Mas foi a luta dos trabalhadores que a isso obrigou!

Mas, ao que parece, falta aos nossos sindicalistas, pelo menos aos que dão a cara, coragem, espírito de persistência e vontade de agarrar o touro pelos cornos. E isto quer dizer que muitas ameaças de luta não passam de bluff, temos quase a certa que a ameaça de se fazer greve nos blocos operatórios, ainda decorria a greve de Janeiro, foi exactamente isso: uma gabarolice. Quando se quer tramar o adversário, nunca se deve ameaçar, porque estamos a avisá-lo do que vamos fazer, e assim permitir que ele se possa defender. A estratégia correcta é dizer só na altura o que se vai fazer, e agora é marcar já uma greve de cinco dias, com a constituição de um fundo de apoio aos grevistas. Fundo que já devia estar a ser constituído, o que prova que a ameaça da “greve dos blocos” foi exactamente um bluff. Greve por cinco dias, e já!

Não vamos falar, pelo menos por agora, de greve por tempo indeterminado, mas é uma hipótese a considerar; e não venham com a treta de que não há suporte legal, porque há, basta consultar o Código do Trabalho. Mas que se avance para a greve por cinco dias, com realização de nova manifestação. No entanto, sabemos que os nossos dirigentes, antes de decidirem da greve, irão perguntar aos partidos onde militam se é oportuno ou não (para os interesses desses partidos, entenda-se) a realização de uma greve numa altura destas em que se procede à discussão e aprovação do Orçamento do Estado na especialidade. E o nosso problema, infelizmente, também aqui entronca; é que a nossa grelha salarial/carreira/etc será o que os partidos da oposição acordarem com o Governo a troco de deixarem passar o OE-2010. Estamos reféns de jogos de interesses entre partidos e temos que saber ultrapassar esse escolho. É bem provável que a nossa luta passe ao lado dos sindicatos, caso estes continuem na estratégia do empata. Também ninguém nos garante que não haja já alguma coisa mais ou menos alinhavada entre sindicatos e Governo; devemos recordar que os jornais, a propósito do acordo dos professores, já sabiam, à hora do fecho da edição, o que seria assinado (e acordado) três a quatro horas depois!

A estratégia do empata é geralmente usada quando se pretende assinar o que se diz não se querer acordar. E os sindicatos dos enfermeiros estão a jogar abertamente nesta estratégia.

2 comentários:

Anónimo disse...

Há muito tempo que venho com grande paciencia verificando a incapacidade da CNESE de por um basta nestas palhaçadas apelidadas de negociações. Após a força que os enfermeiros deram nesta ultima manifestação pensei que os nossos sindicatos optassem por firmeza, por lealdade a todos nós que lutamos para que se faça justiça.Já ouço muitos enfermeiros a falarem sobre uma semana de greve e não vejo outra alternativa. Paula

Anónimo disse...

Não é preciso estar presente nas "negociações" nem ter muita imaginação para saber que se realizam manobras de bastidores entre o governo e os sindicatos. Eu gostaria assim como todos nós enfermeiros (penso eu) de ser informada antecipadamente e consultada sobre essas jogadas. O sindicato deveria ser um livro aberto para nós sócios assim como deveria permitir o debate antecipado das estratégias a utilizar com o ministério.